terça-feira, dezembro 29, 2009

Fumo

Num instante fica-se amputado da memória de um tempo que tínhamos guardado numa caixinha metálica e não se percebe como isso é possível. Também se não compreende como tinha sido possível lá pôr toda a memória desse tempo ao longo de um ano. Mas a magia tem destes coisas, como vem também vai. Afinal, apenas sobrevivem os registos que tinham sido impressos, nessa actividade de que nos auto-acusamos de destruirmos as árvores. Tanta campanha do paper free e agora se constata que a liberdade da recordação depende, realmente, do que o papel regista. Tudo o resto mora não se sabe bem aonde, se não morto, em transformação, se o outro tinha razão. Até é possível que, um dia, também estes registos feitos não sei onde, acabem por se esconder de vez, reduzidos ao silêncio de algum interesse. Tudo é efémero.

sábado, dezembro 12, 2009

Evolução

Quase os mesmos sorrisos, mas com maior consistência. Há árvores que não havia antes. O futuro é já ali.

quinta-feira, dezembro 10, 2009

O ónus da prova

Foi num Natal de há muitos anos. Apareci em casa com um burro de plástico cuja origem não se percebia de onde vinha. Era uma pequena figura de presépio. Acontece que os meus rendimentos na altura não eram compatíveis com a propriedade que exibia. Porque não havia, na altura, direitos constitucionais sobre o ónus da prova, a questão foi resolvida rapidamente depois de um inquérito sumário em que ficou demonstrado que o bicho fora adquirido por via anómala.
Se fosse agora tudo seria diferente. Caberia à Justiça descobrir a origem do cavalo, ir ao local do furto, marcar com umas plaquinhas numéricas os pontos de vestígios do furto, encontrar, cientificamente com DNA e tudo, as provas e depois de construírem uma teoria sobre o caso lá me viriam confrontar com a acusação. Seria possível que nessa altura já eu não me lembrasse da história…
Sem a protecção constitucional, a história acabou com a confissão do delito, a devolução do burro a quem de direito e com umas chineladas do rabo.

quarta-feira, dezembro 09, 2009

Palhaços?

Tenho saudades das boas discussões políticas no tempo em que a política era a discussão das ideias que resolveriam problemas. Hoje em vez de o fazerem, os políticos limitam-se à discussão dos problemas de carácter dos adversários. É um festim para os jornalistas, mas nada resolve. No público reforça-se a ideia de que são todos iguais, quando, na verdade, nem é bem assim. Há uns mais palhaços do que os outros.

terça-feira, dezembro 08, 2009

ST

Boas são as viagens que nos levam à descoberta dos caminhos de que são feitas.

Quinta livro

Quase ao cimo, o poço que descido nos permite ver, de dentro da terra, o céu no alto. E de lá se sai atravessando as águas. Mas não só, toda esta quinta é uma sucessão de pedras que falam numa obra de criação induzida pelo conhecimento do mundo. Fica-se sempre grande quando se conhecem novos mundos nas viagens que se fazem. Uma casa pode além de ser um abrigo, um livro que conta uma história que interpreta uma concepção de mundo.

segunda-feira, dezembro 07, 2009

A difícil economia

Raciocínios macroeconómicos feitos por uma médico devem comportar os mesmos riscos que uma cirurgia feita por economistas. Mas se estes são capazes de elaborar sobre medicina, também a um médico não deve ser vedada a ousadia de perorar sobre economia. Assim nos podemos sorrir uns dos outros.
Ao contrário da Medicina que sendo uma ciência estatística, é bem sabido não ter rigor matemático, a Economia é uma ciência conotada com os números, só que são tantas as formas de apresentar as contas que conseguem obter-se resultados para todas as explicações. E quanto a previsões, recorrem geralmente à teoria do João Pinto sobre os prognósticos.
A Economia é uma ciência tão complicada que nem se ousa ensiná-la ao comum dos mortais. Por isso, todos a temos de aprender na Vida. Para um simples médico a Economia é uma diferença entre o que se produz e o que se gasta, sendo que não é sustentável gastar-se sempre mais do que o produzido. Nas interacções que temos, conseguimos atingir um estádio em que, nas várias intermediações que temos uns com os outros, a produção da riqueza consegue eximir-se à diferença entre produção e consumo. E assim nasceram os actuais ricos, que muitas vezes nada produziram, uns estimulando apenas o consumo, outros elaborando fantasias emocionais sobre como expandir o capital no Grande Casino. Quem manda tem mantido a ilusão com os sobressaltos conhecidos. Até quando durará?

sexta-feira, dezembro 04, 2009

Salto à Vara no país dos pico-nanos

A grande tese da direita mais assumida é que estando o emprego dependente fundamentalmente das pequenas e médias empresas, o combate ao desemprego passa pelo apoio a esses empresários. Nos últimos tempos, tenho tido alguns contactos com eles, com donos de alguns negócios (as chamadas empresas) onde se produzem janelas, portas, instalações de águas, aquecimentos e por aí e tenho-me apercebido da sua iliteracia, do seu saber adquirido apenas e muitas vezes por tradição familiar, da sua facilidade da concepção do trabalho, lentidão da sua execução, incumprimento de prazos, alheamento da inovação e já nem se fala da falta de vontade de pagar impostos. São gente que não aprendeu a gerir, executa tradicionalmente e não tem vontade de aprender, orgulhosa do que faz e com sentimentos de que todos (isto é, o abominável Estado que lhes cobra impostos) lhe devem porque eles são o motor da economia. Andam de Mercedes modelo antigo e vestem roupa de marca comprada na feira para afirmarem o seu trabalho. Têm um infinito objectivo de safar o seu, sem grandes preocupações de outra natureza, nomeadamente o bem-estar dos que lhe fazem a produção. E fico a pensar que é para o peditório destes pequenos ou pico-nanos que nos querem convencer a contribuir e encho-me de dúvidas se essa não é uma forma de perpetuar uma classe que entretém, mas não cria, isto é, de meramente adiar um problema, pois o seu destino será sempre o da falência mais tarde ou mais cedo. Penso mesmo se não seria mais justo serem empregados de alguém que soubesse gerir os seus negócios, que é mais isso que têm e não empresas. Nestes pico-nanos vejo muito do que sempre estão prontos a criticar: os golpes dos políticos e parceiros neste país, como dizem, parecendo que não são de cá. Mas, lá no fundo, fica a impressão da inveja que estes pico-nanos têm do salto à Vara. Mas há saltos que só algumas pernas conseguem dar, tenham paciência.

quinta-feira, dezembro 03, 2009

Há luar no Alentejo


E só o silêncio interrompido pelo piar de um mocho, que vem de algures, no início da noite. No nosso primeiro luar ali.

quarta-feira, dezembro 02, 2009

Doutrina

Têm sempre um ar angélico do bem estes economistas que, reiteradamente, nos tentam convencer que só a criação de riqueza permitirá o alcançar do bem-estar. Sem esse esforço (de quem?) restar-nos-á a continuação eterna desta crise de mal-estar. E andamos nisto há décadas. Melhorámos muito apesar dos discursos da desgraça, só que quando uns comem migalhas e os outros as fatias do bolo produzido, mesmo que os migalheiros fiquem de estômago menos vazio, são os que comem quase tudo que quem realmente se enche. No final do processo da criação da riqueza assim concebida não temos ricos menos ricos e pobres menos pobres, enquanto isso suponha aproximação de classes, mas um aumento mais acentuado da riqueza dos já ricos. Não há repartição equitativa e proporcional da riqueza. Mas a tese continua a ser-nos soprada todos os dias como sendo uma necessária maldição.

segunda-feira, novembro 30, 2009

A denúncia da porcaria do sistema


Andava intrigado com alguma má crítica à nova fita do Michael Moore. «Morde a mão que lhe dá de comer» rezava o Expresso, por exemplo. Só isso já prenunciava que o documentário valeria a pena. Há uma identificação precisa do inimigo. Não são os ricos, mas os que vivem entrincheirados no Grande casino por trás da Wall Street. A cena do crime é aí que se passa, aí e em todas as sucursais espalhadas pelo mundo fora. Esta denúncia teria necessariamente de levar ao desespero os que mamam na verdadeira porca, não a da política, mas a do sistema capitalista.

domingo, novembro 29, 2009

Clã

Há alguma aura no clã, mais não seja pelas fotografias Kennedy-like. Agora reparei que todos são médicos e escritores com livros editados. Cada um compila em livro o que tem: um, as conferências, outro as crónicas de jornais, finalmente, o mais escritor, as angústias. Subentende-se a inteligência de que são providos, mas pressente-se a necessidade da eternidade, como se o estar lhes não bastasse.

sábado, novembro 28, 2009

m2

Há coisas assim, chatas sem relevo, por falta de uma dimensão. É o problema do metro quadrado, que com outra dimensão conseguiria finalmente ter volume, exactamente o volume da altura que tivesse.

sexta-feira, novembro 27, 2009

Sexo genérico

Na fachada da escola secundária ali em Belém, de um lado lê-se sexo feminino, do outro sexo masculino. Era um tempo em que a escola era liceu e, sobretudo, ainda havia sexos. Entretanto, acabaram os sexos e nasceram os géneros. Ainda não percebi por que tiraram o sexo às pessoas. Nos medicamentos não me entusiasmam muito as marcas, mas neste caso suspeito um pouco dos genér(ic)os. Qual a vantagem de ser do género em vez de ser do sexo? Preciosismos ou dúvidas da Biologia?

segunda-feira, novembro 23, 2009

Surpresa

O momento transforma a nossa percepção do acontecimento ou, como é costume dizer-se, só quando passamos por elas sabemos como reagimos. Aquilo que sempre imaginei fosse o sentimento de uma grande festa, não foi exactamente isso quando aconteceu. De repente, dei comigo a sentir um alívio pouco entusiasmado na altura em que passei a esta condição de médico sénior que deixou da fazer serviços de urgência. Será que fui acometido por uma crise demencial súbita e me esqueci de como era incómodo? De uma maneira ou de outra e, exceptuando-se improváveis catástrofes, possivelmente acabou.

sábado, novembro 21, 2009

A casa

É uma casa de muitas histórias. A história de um país onde o pai incitou a filha a emigrar para não limitar o mundo a um país pequeno, para ir cheirar a liberdade. A história de uma vida sofrida, sempre revoltada no sentido certo da liberdade sem tabús. A história das mulheres que vão conquistando cara de homens e, progressivamente, lhes tiram o poder da força, substituindo-o pela força do poder. Provocadora mais que louca, a esta artista vale sempre a pena voltar.
Vale também a visita à Casa sobretudo quando se pode usufruir de uma visita guiada, onde tudo é explicado de forma expressa, quase provocadora também. Sabe bem estar, por um bocadinho que seja, fora, longe, do politicamente correcto.

sexta-feira, novembro 20, 2009

Jet lag

E cá estou de novo, regressado, a este país. Este país, onde geralmente acontecem coisas que só neste país. Ou só acontecerão neste país porque a maior parte dos que cá estão pensam que é o único país do mundo que ainda não está no mundo, no outro, onde os outros já estão há muito tempo, porque o isolamento ficou-lhe entranhado nos genes, na genética da sua impotência de transformar, de fazer diferente, porque encontram sempre um obstáculo fora deles, mas que lhes mora dentro.
Neste país de todos os corruptos, menos o que acusa os outros de corruptos. Esquece-se o idiota que no julgamento de cada um dos outros está também ele. Neste país onde todos fogem aos impostos, menos o que o diz, esquecendo-se de novo que no dizer de todos os outros também ele não os paga. Neste país onde o fado avança com as novas Amálias, o papa virá a Fátima em breve,o FCP continuará a ser campeão com intermitências do Benfica e a selecção é o orgulho de todos depois das vitórias recentes. Neste país em que lá fora identificam o seu Obama chamando-lhe Ronaldo ou Figo. Neste país que nem já é de plástico, mas de sucata.
Sempre a mesma irritação quando apanho o último avião de ligação para Lisboa.

quinta-feira, novembro 19, 2009

Coisas da vida

Nesta coisa da vida parece que há uma boa e outra má. Mas andar na má-vida até não será assim tão mau pelo sabor bom que pode ter e estar à boa-vida também não parece ser assim tão bom, pela monotonia que acarreta. Verdadeiramente mais importante ainda é rejeitar a sobrevida, adiando sempre a vida desejável.

quarta-feira, novembro 18, 2009

KSC

Há sítios onde a História se sente de forma próxima. Em Sagres talvez assim seja, aqui, em Cape Canaveral, é com certeza (embora alguns fiquem eternamente cépticos sobre a chegada à Lua). Mas o que se passa aqui vai muito além do folclore. Naquele tempo em que a economia planificada ainda funcionava e permitia inovação tecnológica de ponta, um belo dia esta gente ficou surpreendida e assustada com uma bolinha que andava em órbita e, mal refeitos do susto, eis que um tal de Gagarine foi dar uma volta ao espaço. Preocuparam-se as almas, que as maldades do comunismo ainda um dia lhes haveriam de acertar nas cabeças e um Presidente inovador, veio acalmá-los e dizer-lhes que haviam de ir à Lua. Caíram foguetes uns atrás dos outros antes que o tiro de Julio Verne batesse no alvo. Esta é a história inocente que se vende no Kennedy Space Center, porque a verdadeira razão do desenvolvimento era a sobrevivência ameaçada, pensavem eles, do seu regime. Foi com esta pesquisa que muitas outras coisas feias, muito feias e aqui não mostradas, se tornaram possíveis. Foi também com isto que o Império cresceu.
Mas para além das realidades feias, há aqui uma mensagem simpática: o objectivo é o erro zero e para isso é necessário fazer o esforço máximo. Sim, falhar não é permitido e é necessário pôr tudo na acção. É a parte boa, optimista, no meio da sordidez oculta.

terça-feira, novembro 17, 2009

Apreciação da lucidez

A lição mais importante deste congresso chegou-me, de surpresa, numa comunicação sobre obesidade. Finalmente, começo a ouvir alguém que entende as causas das causas e que diz sem rodeios que de nada vale andar a tentar mudar as pessoas, os seus comportamentos e força de vontade, porque elas irão continuar iguais a si próprias na busca dos caminhos simples e satisfatórios da sua sobrevivência. Sim, insistir na busca da pílula mágica ou da cura pela cirurgia, é uma escolha errada de alvo e quando nem o inimigo se consegue identificar como poderão ganhar-se as guerras. É o ambiente, estúpidos! É, uma vez mais a ganância que neste campo também leva è ruína.
Fico grato a Deborah Cohen pela clareza do discurso, longe das nebulosas diatribes à volta das calorias dos hidratos de carbono, das proteínas e dos lípidos, longe das técnicas de reparação do desastre que são as cirurgias.
Sorrio a pensar que no próximo fim de semana, lá se encontrarão uma vez mais no repouso agitado de mais uma congresso de obesidade, os nacionais-cientistas na mesma discussão de sempre.

segunda-feira, novembro 16, 2009

Onde está Orlando?

Não é bem uma cidade, mas antes um gigantesco e disperso parque de diversões, onde só se anda de carro ou monorail, sem a oportunidade de se poder caminhar no aperto de passeios que ligam destinos.
Boa mesmo só para gozar o clima de Primavera-Verão em tempo de Inverno. Mas há um grande vazio neste recreio gigante. Ao fim de uns dias ainda nem se percebe muito bem onde se está e onde estão os que aqui trabalham. Sim, porque as cidades, mais que os que as visitam, são os que as habitam. E no meio destes castelos e fantasias de Walt Disney nem sombra se vê das tocas onde estão.

domingo, novembro 15, 2009

A fuga da arbitragem

Temos esta condição de agirmos mesmo quando nos furtamos a agir e das nossas acções sempre resultam consequências. Muitas vezes, em termos pessoais, a acção é mais incómoda que a sua ausência, mas tanto agir como a negação da acção acabam por ter consequências nas vítimas do acto, ainda que efectivamente seja uma inacção. Sempre qualquer decisão de agir ou não deve estar subordinada, por todas estas razões, não à nossa comodidade, mas Às consequências que resultam. Ou seja, os nossos actos devem estar orientados por princípios éticos e não por eventuais cobardias auto-satisfatórias. Contudo, infelizmente, é raro que seja estritamente a ética a ditar a acção. Daí a grande disponibilidade para a desistência perante a incomodidade, agora que se acha ser esperteza o que dantes era cobardia.

sexta-feira, novembro 13, 2009

O isolamento da liberdade

De repente, sou assaltado pela nostalgia daquela imagem de ver uma plateia imensa dentro de um avião em movimentos convulsivos de riso, a verem uma fita do Mr Bean. Era o tempo em que havia uns ecrãs grandes na parede, onde os filmes eram projectados para visão colectiva dos passageiros.
Agora, temos um ecrã pequenino, nas costas do banco da frente e a chamada liberdade de escolha. Cada um vê, ouve, joga aquilo que lhe apetece. Visto da cadeira da coxia da fila 33 há um ecrã de cada cor e assunto diferente nas cadeiras avistadas. Cada um isolado dos outros, sem a liberdade de uma experiência comum. Uma vez por outra vê-se alguém isolado perdido de vontade de rir, mas contendo a extravasão da gargalhado pelo receio do ridículo de se pôr ali no meio dos outros a convulsivar. Dantes era mais fácil pela solidariedade cúmplice dos parceiros de gargalhada. E, desta forma, lá se vai a liberdade individual, afinal. Nas pequenas coisas o mundo vai mudando e eu fico cheio de dúvidas sobre o mérito do sentido da mudança.

quinta-feira, novembro 12, 2009

Corrupção!

Finalmente uma capa do Correio da Manhã citando um verdadeiro escândalo!

Racionamento

Fez sucesso durante vários encontros de família nos tempos que se seguiram o desejo que manifestei, imediatamente depois de receber um barco naquele Natal dos meus 3 anos de idade. Procurando chaminé acima o Pai Natal, encantado com o barco de plástico beije e vermelho, apertado nas minhas pequenas mãos, expliquei ao ofertante que «agora só falta o mar». Aos 3 anos é ambição para recordar depois com um sorriso.
Passados estes anos, percebo o problema do não racionamento dos desejos. No mundo real da oferta e da procura, percebe-se com facilidade que os nossos desejos estão limitados pelas nossas capacidades de os obter. Geralmente, o poder aquisitivo é o limite. É uma forma triste de nos limitarmos, mas é a que existe.
Quando se introduzem regras de gratuitidade, a tendência natural é para o desregramento do consumo induzido pelo desejo de tudo ter. Esta é a origem da necessidade das regras que racionem os bens desejados. No caso do consumo da saúde, competirá aos técnicos a elaboração das regras, que, tornando acessíveis os cuidados, não levem ao desperdício. E mais vale gastar o tempo na busca dessas regras, do que na procura angustiada da resolução do caos. Pena é, que os técnicos de quem se espera a decisão tenham, na sua ordenação de preocupações muito perto do fim da lista, a resolução dos problemas dos doentes. No cimo da lista estão sempre as preocupações de imagem e os receios das más notícias. É uma estratégia que, ironicamente, os leva com frequência às primeiras páginas dos jornais pelos motivos que menos desejam.

quarta-feira, novembro 11, 2009

Livro das definições

Coordenador é o tipo que o Chefe escolhe para fazer o trabalho, de que o Chefe receberá os louros quando correr bem depois de nada ter feito além da nomeação. Ao coordenador cabe igualmente sofrer as consequências dos eventuais desastres resultantes do seu trabalho.
Dito de outra forma, coordenador é uma espécie de Ministro do senhor Engenheiro.

sábado, novembro 07, 2009

Era uma casa
Muito engraçada

Não tinha teto
Não tinha nada
Ninguém podia entrar nela, não
Porque na casa não tinha chão
Ninguém podia dormir na rede
Porque na casa não tinha parede
Ninguém podia fazer pipi

Porque penico não tinha ali
Mas era feita com muito esmero
Na rua dos Bobos
Número zero

Vinicius

Era uma imaginação de criança, depois cresceu... Quase adulta finalmente.

sexta-feira, novembro 06, 2009

Se faz favor (continuação)

E continuando temos agora a versão do sff, mude-se o júri que este não convém... No limite, ir-se-á eliminando um júri atrás do outro até se nomear o júri certo... escolhido pelo candidato! E se a moda pega, os júris passarão a ser escolhidos por consenso? E se não houver o consenso, não há concurso?
Se faz favor, alguém pode explicar?

quinta-feira, novembro 05, 2009

Poder

O poder apenas usado para enfeitar não tem sentido. Os discursos saem bem, até podem encher os egos, mas que sentido tem isso se o poder não servir para seguir no rumo que se quer? O poder de não mandar? É um poder do medo, de poderosos assustados. E tudo fica impune.

segunda-feira, novembro 02, 2009

A reforma urgente

Continuam a existir centros de saúde sem sistema informático ou com banda demasiado estreita! Isto significa desperdício, duplicação de exames, terapêuticas repetidas, quebra de continuidade de cuidados, desinformação, solicitação inadequada de consultas, em resumo, esbanjamento de recursos. Com isto estão a ir-nos ao bolso, a delapidar os impostos dos pagantes.
Isto deveria ser motivo de título em parangona grande em todos os jornais, infelizmente, muito mais ocupados com as misérias futebolísticas ou com as formas de estar na política. Isto é corrupção activa por passividade. Tão grave quanto a outra. Isto é, de longe, muito mais importante que a saga da gripe A.
Só uma visão muito estreita pode, nestes dias, recusar a banda larga. E quem não consegue ver, o melhor é reformar-se... com urgência.

Cepticismo ou visão?

Ontem ouvi um russo dizer que a preocupação deles não era tanto a gripe, mas mais a tuberculose multirresistente. Pareceu-me haver ali sabedoria. Por cá vejo que alguns com o receio da gripe, precipitam decisões na tentativa de ficar bem na fotografia e de obter o silêncio cordato dos media. Tudo fazem para que a gripe corra bem. O problema é o da manta curta, neste caso mais agudizado. Tapam de um lado, mas sobra o descoberto do outro. Acabam por evitar a ameaça, mas assumem a exposição das chagas reais. Fazem gripar o funcionamento da máquina, pelo receio dos fantasmas.
Boa sorte e que Deus os acompanhe, que eu não creio.

quinta-feira, outubro 29, 2009

Jornalismo básico

As circunstâncias da morte não estão esclarecidas e a história tem algumas fragilidades. Uma ideia mais aproximada do que terá acontecido talvez venha a ter-se depois da autópsia.
O que se lamenta desde já é mais esta expressão de jornalismo básico, a exibição da raiva para se venderem mais uns jornais e uns anúncios de televisão, de forma irresponsável, incitando a população a ir aos hospitais exigir análises, contaminar-se e ser contaminada. COM SINAIS DE GRIPE FICA-SE EM CASA E SEGUEM-SE AS INSTRUÇÕES DO SERVIÇO TELEFÓNICO QUE FOI CRIADO! O internamento hospitalar, nesta fase do processo, é para quem necessita de cuidados diferenciados e intensivos.
Estranho também a miséria moral da exibição de uns pais a quem acaba de morrer um filho. Não vi quase expressão de dor, esmagada que estava pela raiva e desejo de vingança. Vivo num mundo de seres diferentes.
Lamento também a asfixia informativa das autoridades de saúde. Há momentos em que a táctica de escapar por entre as gotas da chuva, esperando que passe, não resulta e é necessário dar um murro na mesa.

terça-feira, outubro 27, 2009

O dia é hoje

Enquanto ainda não tinha adormecido na acção de sensibilização à gripe A, pensava para com os meus botões, que a morte só assusta quem está à espera de amanhã para começar a viver. Tranquilo é viver hoje e sorrir virado para o passado fugindo de medos paralisantes. Quando olhamos à volta, percebemos que estamos cheios desta sabedoria, mas alguém necessita, quase de forma desesperada, que tenhamos medo e acreditemos na vida eterna, só que nos não dizem onde nem quando. Não, obrigado!

segunda-feira, outubro 26, 2009

Os sem-médico

Contam-me sempre histórias parecidas de abandono. Para uma receita têm de ir para a porta do Centro de Saúde às cinco da manhã, falam-me de médicos de recurso, um hoje, outro amanhã, na negação da continuidade de uma relação de confiança médico-doente. Outras vezes também me custa ver a falta de confiança nos seus médicos de família. Sempre lhes vou dizendo que os médicos de família são os mais importantes na promoção da sua saúde, mas quase sempre desconfiam, cheios que estão também desta cultura dominante hospitalocêntrica. Assim, aos poucos vou também sendo médico de família num hospital central.
Não é fácil inverter uma situação onde os recursos estão no sítio errado, quase dois terços nos hospitais e o resto na Medicina Geral e Familiar. Já me choca ver um Ministério centrado quase e só numa gripe (que não h)Á, sem atender aos grandes problemas da Saúde. Por isso, sempre que a oportunidade surge, os incito a usarem os livros de reclamações, a manifestarem-se se necessário, porque não ter médico de família é bem mais grave que não ter um pseudo-serviço de urgência ao fundo da rua. Pena é, que a Imprensa do regime a nada disto consiga dar eco. E vamos criando, mais hospitais uns atrás dos outros, cada vez mais privados com dinheiros públicos a pagarem as contas da sua gestão. Lixados, continuam os sem-médico. E todos nós.

domingo, outubro 25, 2009

Leituras


Parece ser agora, politicamente correcto, fazer a crítica de Saramago, não lhe permitindo ter da Sagrada Bíblia a leitura literal. Quer-se pôr simbolismo e poesia onde sempre se procurou a aceitação literal da dor, do sofrimento terreno para, literalmente, se obter a gratificação por cima das nuvens. Podem os Sagrados livros não dizerem nada do que dizem na escrita fria das palavras, mas alguém se esqueceu descodificar a sua leitura anos demais. E, realmente, dessa forma foi pelo menos usada como livro de maus costumes e de justificação das guerras, pelos seus leitores ou por aqueles que foram transmitindo a sua mensagem para facilitação do poder da classe dominante ao longo dos tempos. Deus pode não ser mau, mas alguém leu as suas obras e omissões de forma a que a injustiça pudesse vingar, impedindo, quantas vezes, a expressão da vontade da correcção do erro por parte dos homens. O Todo-Poderoso foi, com frequência, demasiado liberal abdicando da utilização do Poder, permitindo demasiada liberdade à iniciativa privada. Era bom que tivesse tido uma atitude mais reguladora, impondo a orientação certa do seu enorme conhecimento, mostrando a sua existência. Não o fazendo, tornou-se, literalmente, inexistente, simbólico, talvez. Por isso, Saramago tem razão, porque a Vida é a vida e não uma entidade simbólica, com uma multiplicidade de códigos, que a interpretam.

sexta-feira, outubro 23, 2009

A lição do sol


Já algumas vezes me levantei de madrugada para fazer a tolice de ir ver o nascer do sol. Muitas mais, me pus sentado à beira-mar a vê-lo esconder-se no fim da tarde. Há um encanto diferente nos dois momentos. A frescura da manhã e a passagem do azul escuro com estrelas ao azul claro aliada ao sono com que se presencia o evento, fazem do nascer do sol, seja no Uluru seja no Saara, um momento belo, mas associado a algum desconforto. É preciso algum cansaço no corpo para se aproveitar todo o encanto destas coisas. O nascer do sol é também mais brusco, dura menos e logo se segue a banalidade da subida e o desconfortável aumento da temperatura. Nalgum instante, a pujança do sol, faz-nos procurar a sombra, tentarmos que se esconda. E assim se passa a maior parte do dia, até ao fim da tarde, quando o horizonte se vai alaranjando naquilo que, dizia a minha avó, seria prenúncio de dia solarengo amanhã. Aqui o tempo é mais gostoso e demorado, na mudança progressiva das tonalidades, no avermelhar das nuvens esfarrapadas. Apetece a música, a companhia e, tantas vezes, pão, queijo e um copo de vinho, ajudam ao inebriar dos sentidos. Aos poucos tudo acaba.
A vida é também um dia de sol, mas ao que me parece, sem nascimento no dia seguinte. Por isso, é fundamental que o apogeu, necessariamente agitado, seja rápido, de forma a que o longo caminho final tenha toda a magia colorida do entardecer.

quarta-feira, outubro 21, 2009

Poderes

Raio de sorte esta que nos faz sentir o poder como dever e não como privilégio, porque se é da natureza do trabalho e não da natureza da honraria. Resta a surpresa de ver os quem me dera nos olhares que nos contemplam. Nessa altura também temos o quem nos dera ser, ainda que só por alguns momentos, dessa forma. Assim, simples, virado somente para o lúdico da coisa e não ter sempre às costas o peso de fazer ou a necessidade de dar utilidade ao poder. Complicado, isto de ter sempre uma missão. Que os resultados nos façam rir aqui e além como compensação do sacrifício do poder.

terça-feira, outubro 20, 2009

O deputado aiatolá

O disparate é livre. E este pindérico eurodeputado não se inibiu na procura dos seus 5 minutos de notoriedade. A diferença de estatuto é total, do crítico nada ficará na memória do tempo, nem mesmo, talvez, a crítica; o criticado será eterno apesar da crítica. A diferença é que um é português e tem a dimensão do mundo. O outro mais um portuguesito apoiante da selecção nacional, de bandeirita à janela.
Serve talvez o episódio para revelar a verdadeira asfixia, a anti-democrática. A bem da Verdade (essa palavra mentirosa em certas bocas) reconheça-se que são reincidentes, os canalhas. Todos nos lembramos do episódio da rejeição do Evangelho, menos serão os que se lembram do nome do autor, que a fama do absurdo é coisa breve. Mas provinha da mesma Inquisição.
Este país é uma pena. Pequeno até nos aiatolás que gera, sem a dimensão dos perseguidores de Rushdie. Onde estavam eles, que disseram sobre ofensas à fé, quando os Versículos vieram a lume?

Ó Portugal, se fosses só três sílabas,
linda vista para o mar,
Minho verde, Algarve de cal,
jerico rapando o espinhaço da terra,
surdo e miudinho,
moinho a braços com um vento
testarudo, mas embolado e, afinal, amigo,
se fosses só o sal, o sol, o sul,
o ladino pardal,
o manso boi coloquial,
a rechinante sardinha,
a desancada varina,
o plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,
a muda queixa amendoada
duns olhos pestanítidos,
se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,
o ferrugento cão asmático das praias,
o grilo engaiolado, a grila no lábio,
o calendário na parede, o emblema na lapela,
ó Portugal, se fosses só três sílabas
de plástico, que era mais barato!


*
Doceiras de Amarante, barristas de Barcelos,
rendeiras de Viana, toureiros da Golegã,
não há "papo-de-anjo" que seja o meu derriço,
galo que cante a cores na minha prateleira,
alvura arrendada para ó meu devaneio,
bandarilha que possa enfeitar-me o cachaço.
Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao osso, fome sem entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso de todos nós...

Alexandre O'Neil

segunda-feira, outubro 19, 2009

Estratégia

Se o dia está de sol, de que vale pensar em estratégias para contornar as gotas da chuva? Que venha a molha, que logo se enxuga.

domingo, outubro 18, 2009

Estar no tempo

Como uma bênção este esquecimento de tudo o que tenho para fazer permitiu que o domingo fosse dia santo. O tudo seria assim tão importante que justificasse não ter visto a Madama Butterfly, pela crónica falta de tempo?

Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos).

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para o pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente.
E sem desassossegos grandes.

F Pessoa

sábado, outubro 17, 2009

O terrorista professor

Acontecem às vezes períodos de hibernação por falta de assunto ou cansaço e indiferença perante os raros temas de comentário. O desligar ocasional do tempo que nos envolve justifica-se perante a ausência de algo que seja relevante dentro de 5 anos. Muitas coisas fantásticas têm apenas reservado o seu lugar em listas raramente consultadas de eventos. Afinal, quem se lembra de quem ganhou a maratona X ou o prémio Nobel Y? Quanto tempo duram esses momentos fantásticos? O que permanece de todos nós e qual o nosso objectivo? Que sentido tem marcar a existência? Quase sempre existimos como as pegadas deixadas na beira-mar à espera da próxima onda, primeiro muito bem delineadas, logo a seguir apenas esboçadas com os contornos mais imprecisos, finalmente a areia retoma a forma original como se nada tivesse acontecido. Apenas fica a geografia e o permanente diálogo dos elementos no escoar do tempo.

Reflectir é uma actividade cada vez mais perigosa e inconsequente nos tempos em que a moda é das poucas formas de gratificação. Voltando ao mar, ir na onda é a maior tranquilidade. Cair do tsunami, então, é o supremo gozo, a adrenalina na sua forma mais intensa. Há quem consiga, outros não. Quando a genética o não permite, há que procurar outros analgésicos que atenuem a dor do irresolúvel. Deve ter nascido aí a ideia dos valores e da moral. Algo a que poucos se apegam, mas serve de lenitivo a alguns.

Há um endeusamento da sobrevivência que nos faz esquecer a importância da vida. Sem notar a idiotice do que dizia, ouvi há dias um guia de um parque zoológico, afirmar convictamente que ali no parque, em cativeiro, os animais viviam mais 10 ou 20 anos, que no seu ambiente natural. Dizia isto como se de coisa vantajosa se tratasse, o pobre sobrevivente. Curiosa esta cultura do medo da morte, que gera todos os outros medos (da gripe, da carne de vaca, do terrorismo e tantos outros), esquecendo o único medo que se justificará, o de adiar a vida na sobrevivência a todo o custo. A morte surgirá inevitavelmente, quer tenha ou não havido vida. É por isso que um quantificador de vida acrescentado todos os dias é tão importante para que, no momento final, não se constate que o conta-vidas está a zeros...

No meio disto, sorrio da importância dos resultados eleitorais,dos jogos dos pequenos poderes dos desatentos. Fico mais interessado e divertido com o horror ao vazio do terrorista que vive em minha casa. Ele percebe que a vida é para ser feita acompanhado e, sempre que o deixam sozinho, reage, sem piedade, de forma bárbara com um atentado diferente todos os dias. Um dia derruba todos os vasos que apanha, noutro despeja os detergentes arrumados no armário, nunca se detém nem conforma com a vidinha que lhe querem impôr. Depois, olha-me sereno, a explicar-me que sobrevivência não é bem que aprecie. Cordial, pede a minha compreensão perante mais um atentado e oferece-me um dos seus brinquedos. Não é o perdão que quer, porque, para ele, como para qualquer terrorista que se preze, melhor será a morte que tal sorte. Determinado, este terrorista que vive em minha casa. Muitas vezes, mais se aprende com este terrorista professor do que com os homens. E para que conste, aqui fica o perfil.

terça-feira, setembro 29, 2009

A comunicação

Neste país, o Sr. Silva fez uma comunicação ao país expressando as suas interpretações pessoais. Por ser parecido fisicamente com o Presidente da República, alguns terão pensado que era o supremo magistrado da nação que estava a falar. Mas isso não deve corresponder à realidade, porque um PR não fala assim. Mais uma vez a imagem é enganadora. Em boa verdade, um PR que falasse daquela maneira só teria uma atitude a tomar: demitir-se, obviamente!

O espaço, o tempo e o poder

Citando a velha senhora, é mais ou menos indiferente estar a 14 m ou a 13,5 m de profundidade. Realmente, só de submarino se consegue andar por lá. Fica assim esclarecida a necessidade nacional de ter comprado os ditos cujos.
Já não sei é se será a mesma coisa divulgar estas investigações hoje ou uma semana antes. Realmente, se as diferenças do espaço poderão até nem ser importantes, certas diferenças de tempo são um pedaço suspeitas.
Grandes são os poderes do Ministério Público e da sua câmara de ressonância.

segunda-feira, setembro 28, 2009

Dá para os dois lados

Também desta vez, a vaga de fundo da tal maioria silenciosa, não surgiu a inquietar o dia 28 de Setembro. Foi calmamente que o dia se iniciou e nem a agitação de rua foi intensa. Afinal, todos foram deitar-se com algum sentimento de derrota depois de cantarem vitória.
O PS ficou no meio, com possibilidade de dar para os dois lados. A dúvida que persiste agora é saber para que lado se volta este PS. Ficou claro que dum lado tem 10% e do outro 2 vezes quase 10%. A par tem a mesma coisa só que com outra cor. Mas como a mistura do laranja com o rosa deve dar uma cor mal definida para lhe não chamar outro nome mais fétido, em princípio, não irá por aí.
Dizem que há uma maioria de esquerda, esquecendo os que o dizem que isso coloca desse lado um PS, que quanto mais se olha em pormenor o que defende em política económica, internacional, por exemplo, mais parece tender para a direita. Visto desta maneira são mais as semelhanças com o CDS do que com o outro lado e não seria inédito nem estranho que, uma vez mais, renegasse a História. A ver vamos, como diz o cego, porque nesta altura é muito difícil prever para qual dos lados se virará o engenheiro. Ou irá tentar ficar com um pé em cada lado, correndo o risco de cair de pernas abertas um destes dias, partido ao meio.

quinta-feira, setembro 24, 2009

Asfixia informativa

A imagem com que fico é que isto dos assessores de imprensa devem ser uma espécie de delegados de informação médica. Simpáticos, cordiais, com ar de não quererem vender nada, até trazem informação de pretensa qualidade, tudo, segundo dizem, servido sob uma ética irrepreensível. No meio de uns almoços, deslocações e viagens. A busca de informação de qualidade dá trabalho, é preciso ler livros e revistas, analisar os resultados das investigações. Mal dos médicos, que deixam a sua actualização aos cuidados dos delegados de informação médica. Mal dos doentes que se consultam com tais profissionais.
Como alguns médicos, também os jornalistas estão em risco de satisfazerem a preguiça não procurando a notícia, deixando que ela venha até eles por fontes menos recomendáveis. Fazendo eco do que lhes chega prestam um mau serviço aos seus leitores. Mal dos leitores que tal informação consomem.
É arriscado que um Estado deixe aos pruridos éticos de uns e outros a relação entre os assessores e delegados e os jornalistas e os médicos. Em nome de uma prestação de cuidados capaz e de uma informação de qualidade, seria bom que criasse regras de convivência, que impedissem a promiscuidade e a preguiça. Mesmo que isso levasse ao desemprego de alguns destes profissionais da «informação». A vida ficava mais difícil, mas o ambiente mais respirável. Haveria menos asfixia informativa. Pelo menos os conflitos de interesse das redacções e o enunciado bem destacado da propriedade dos meios de comunicação deveria estar bem patente nas primeiras páginas e nos rodapés dos telejornais.
E, já agora, seria bom lembrar aos mais distraídos a filiação partidária dos Presidentes da República e proibir-se que digam que o são de todos os portugueses. É claro que o não são e que há silêncios que gritam.

quarta-feira, setembro 23, 2009

O homem dos tabús

Nele, o silêncio é cíclico. Neste momento deve estar a devorar bolos-reis uns atrás dos outros à espera do que pensa ser uma maioria silenciosa. Esperemos que no próximo dia 28 de Setembro lhe aconteça o mesmo que no outro, que a reacção não passe e que, não tendo que fugir para Espanha, assuma as suas responsabilidades e actue em conformidade. Sem tabús.

segunda-feira, setembro 21, 2009

Belemgate

Será que estou a entender bem? Um assessor do PR, em seu nome, tentou manipular informação com vista a comprometer o Governo e por um deslize informático acabámos por saber que assim foi? E o que foi é que existe um jornal de referência (de que é dono o D Belmiro) que se presta a esta manobra. Em nome do direito à verdade, fico à espera (com urgência) dos novos episódios do Belemgate.

Asfixia

Há muito que foram abandonados os argumentos programáticos e, agora, todo o cerne das campanhas surge cheio de atribuições morais, sobretudo a denúncia da imoralidade dos adversários. É o paga-não-paga impostos, o tem-não-tem acções e PPRs que enche as notícias, ficando os programas, as soluções sem debate ou discussão. Atribuir a falta de moralidade ao inimigo é o único argumento, sobretudo quando as diferenças de programa até são de difícil enumeração. O debate das ideias não dará votos, concluíram.
E os receptores da mensagem estão, efectivamente, cansados de conteúdo. Cada vez mais, mesmo nas conversas banais do dia-a-dia, o debate das ideias é incómodo, chegando a sentir-se ser o debate político, politicamente incorrecto. O país fica cheio de moralistas, críticos de todos sem excepção, parecendo a multidão que critica um conjunto de virgens impolutas. Todos bons pagadores de impostos, todos trabalhadores cuidadosos na satisfação do próximo, impecáveis pais e mães de família, sem ponta de egoísmo ou ganância nas suas acções. Uma coisa os une, a vontade exclusiva de conversar sobre o tempo que faz, o futebol os mexericos cor-de-rosa. Tudo o mais é tabú neste mundo social asfixiado pelas conveniências de classe. O mais angustiante vazio neste ar que se respira.

segunda-feira, setembro 14, 2009

Mulher de Lata

Pérolas de Manuela Ferreira Leite que atestam a mentira da verdade. Disse a Senhora nos Açores:
1. "José Sócrates tem um projecto de natureza pessoal para se manter no poder, só pode ser de natureza pessoal, não pode ser pelo País." Em boa verdade, não disse qual era o projecto, é uma convicção dela, sem provas mostradas e grave, porque caluniosa. Dá para fazer títulos de jornais, mas não vai além da calúnia.
2. Sócrates, um homem que, diz, "inventa calúnias" e "só gosta de quem gosta dele e de quem o apoia". "Não é possível em democracia que o apelo ao voto seja feito com base no engano", sublinhou. Pode ser que invente calúnias, mas nada que se compare ao que outros têm feito até agora contra ele nessa matéria. Por outro lado, gostos são gostos e é natural que gostemos dos nossos. Nesta matéria MFL é muito mais radical, quem diverge dela é pura e simplesmente afastado. A intolerante, se não me engano, e com provas dadas é ela. Portanto tem razão na última frase, é indecente fazer apelos ao voto com base no engano.
3. Depois este retrato do país (com anotações minhas): Visto dos Açores (deve ser um problema de visão, coisas da idade), Portugal está pior do que nunca (onde andava ela antes de Abril?). A Saúde está de braços cruzados (inspirada numa imagem dos folhetos de promoção de clínicas privadas), a Educação está de costas voltadas (os professores finalmente começaram a dar aulas e a escrever nos quadros), a Justiça está de joelhos (que me perdoem os muçulmanos, mas seria pior noutras posições de oração), a Segurança está de cabeça perdida (decapitações em esquadras foi noutras ocasiões, se bem me recordo), a Economia está com a corda ao pescoço (é justo depois das falcatruas feitas que sigam o exemplo de Egas Moniz). E como se não bastasse, os trabalhadores protestam nas ruas (preferiria as manifestações de estudantes do tempo em que governou?) e as famílias desesperam na banca (estará a falar do BPN dos seus correlegionários ou será por causa da redução dos spreads?)", realçou.

Esta senhora que tenta dar de si a imagem da Dama de Ferro, não consegue ser,realmente, mais que uma Mulher de Lata.

domingo, setembro 13, 2009

Surpresas

Não é por mal que se pergunta, tudo bem?. É somente por rotina, para calar o silêncio em que nos desabituámos de estar. No meio da bruma destes dias, acena-se que sim, claro! quando a vontade era mais chamar idiota à pergunta, dizer, mas que raio tem você a ver com isso que pergunta. Somos incapazes de respeitar os espaços uns dos outros, por hábitos, por rotinas politicamente certas e nada é feito por mal, embora faça mal e apeteça responder à chicotada.
Mesmo quando ainda nos sentimos como se tivéssemos 30 anos, afinal, quem quase os tem são já os nossos filhos e nós passámos a ter o estatuto e direito a estar com as doenças que aparecem depois dos 50, mesmo que, lendo a sua descrição, achemos que aquilo não nos assenta bem. De repente, envelhecemos uma data de anos. Subitamente, percebi que o envelhecimento não é uma mais-valia de experiências feita, mas um conjunto de sintomas vagos encontrados em muitas doenças. Por isso, o envelhecimento como valor acrescentado é, necessariamente, um diagnóstico de exclusão depois de terem sido eliminadas todas as outras. Apenas, nessa altura.

sábado, setembro 12, 2009

Debate

Do que vi a professora foi a aluna mal preparada e o engenheiro o examinador implacável. Foi tão forte o questionário e tão frágil a candidata, que apenas se pode, honestamente, propor-lhe que volte na próxima época ou que desista da função. Só que desistir é impossível e, pela idade, esta era a última oportunidade. Ao pé desta candidata, quase parece que José Sócrates é o único PM viável. Este país já está mal servido de PR, porque se enganou da outra vez. Será bom que não repita o erro e arranje uma PM ao nível. Com representantes desses, são os representados que perdem, mas a história recente mostra que nos Estados Unidos, ainda há não muito tempo foi isso que aconteceu: uma maioria da população passou pela vergonha de manter Bush a dar aquela miserável imagem da América ao mundo.
Ainda assim, espera-se que daqui a 15 dias, um desastre idêntico não nos venha a afectar. Numa terra de seres pensantes, depois do que se viu, a coisa estaria decidida. Mas nada garante que seja o caso e que mais casos insinuados não venham, no desespero final, alterar o resultado deste jogo. Mas quando as ideias faltam, da direita desesperada todo o terrorismo é de esperar.

sexta-feira, setembro 11, 2009

As aulas começaram?

Havia uma fila maior quando descia a rua hoje de manhã. Será que começaram as aulas? A Ministra da Educação foi uma nódoa, dizem os professores. Mas não me lembro de nos anos anteriores ter havido um início de aulas como este. A ausência de notícias sobre o facto, leva-me a crer que foi um anormal início normal das aulas. Não era a isto que estávamos habituados.

quinta-feira, setembro 10, 2009

Caminhos

Há caminhos que mais não são que atalhos, estreitas veredas de mau piso. Mas é nas estradas secundárias que mais se aprecia o percurso, não necessariamente nas auto-estradas. O gozo é a atenção ao prazer.

terça-feira, setembro 08, 2009

Como nunca os vimos

Às vezes acontece televisão inteligente e para quem quiser aproveitar poderá ser até mais esclarecedor que aquelas conversas assépticas, regradas por tico-ticos da certificação do debate, onde apenas se assiste à mesma festa do costume de malhar no mesmo. Esses debates que levam a que o título do dia seguinte seja PCP e CDS concordam qualquer coisa, porque no calor da refrega anti-inimigo comum se esquecem de realçar e se atacarem nas suas discordâncias.
Mostrar as pessoas, poderá ser mais esclarecedor, mas será necessário desmontar a eventual representação induzida pelo marketing que se irá adaptar a este tipo de notícia e possivelmente controlar a sua eficácia. Para começar e antes dos truques tiveram a sorte de o primeiro entrevistado ter sido este. Espera-se que faça a diferença, porque, afinal, é diferente e os políticos não são todos iguais, ao contrário, do que a propaganda insinua numa sofisticada desmotivação da participação. Mas não participar é o mais perigoso de tudo como já bem reconhecia Platão: «A penalização por não participares na política é acabares a ser governado pelos teus inferiores.» Ou seja o fenómeno não é novo, antes induzido pelos poderosos de sempre na ânsia de perpetuação do seu poder.

segunda-feira, setembro 07, 2009

Negro

Há depois aqueles instantes em que se acabam os objectivos, as estratégias e fica um enorme vazio de certezas. Afinal, nem se percebe o percurso andado quanto mais o que falta percorrer e só as dúvidas cavalgam sobre o nosso lombo. Fica um enorme peso no ar e é como se as cores todas tivessem fugido do quadro reduzindo-o a um negro absoluto em que o tempo parou. Onde está a ponta da BIC com que vamos criar a linha raspando o óleo a mais para ressurgir a forma nova?

sexta-feira, setembro 04, 2009

Inseguros

A justeza do lucro privado está no grau de risco que assumem. Dizem. Na teoria, porque na prática, a verdade é outra bem distinta. O lucro privado provem mais da ganância do que de qualquer justiça. Por isso, é normal que as seguradoras ajam desta forma. O que é absolutamente anormal é pensar-se que há formas de substituir o Estado (todos nós, solidariamente) nas despesas da Saúde. Com os privados será sempre assim, quando a coisa der para o torto, venha o Estado pagar. Foi assim com a Banca, é assim com as seguradoras. A natureza deles é o lucro, o não pagamentos dos impostos, a ganância, a geração de valor. Está a fazer um ano que assistimos à hecatombe da economia liberal, mas a memória é curta e a reflexão proibida. Por que aconteceu? Pela natureza do sistema, direi eu.

quinta-feira, setembro 03, 2009

Ponto final

Se a Verdade fosse a sua preocupação, hoje teríamos a Dra. Manuela a celebrar o fim do escarro jornalístico que eram os telejornais da sexta-feira. Aquele jornalismo caceteiro, manipulador, desinformativo há muito que deveria ter sido posto a andar assim como a sua mentora. A posição CORPORATIVA do Sindicato percebe-se. Às corporações interessará sempre mais defender os seus do que a Ética. Já é um pouco estranho ver esta gentinha muito direitinha da política nacional vir pôr em causa uma decisão de um conselho de administração de uma empresa privada. Ainda mais triste é ver a falta de verticalidade, de coluna vertebral que a esquerda também aqui demonstra ao não denunciar com energia o nojo a que algum jornalismo descia. Realmente, não devia valer tudo, porque a seguir esse princípio, em breve nada vale nada.
E se a grande boca se preparava para amanhã voltar a vomitar o fel que lhe ia dentro, pois que o faça. Certamente, não faltarão locais onde o pode expressar, incluindo a Judiciária onde poderá apresentar as suas provas. Ou será que só tem insinuações felinas (com fel, entenda-se)?

Se faz favor...

No futebol temos notícia de que os árbitros são encomendados, rejeitados, aprovados ao longo da semana em múltiplos telefonemas por vezes gravados às escondidas dos autores. O jogo sai depois como se sabe.
Na carreira médica a coisa é mais linear: pede-se, por escrito, a um dos candidatos a um concurso que nomeie o júri que há-de escolher quem virá a ter o lugar em disputa. O resultado é conhecido antes do próprio jogo. Para que se vai ao campo?
Ainda aqui, o futebol, pela sua discrição, parece ser uma escola melhor, com algum savoir faire.

quarta-feira, setembro 02, 2009

O bobo da SIC

Tem um ar de avozinho matreiro e arranjou uma cantiga que vai repetindo ora aqui, ora acolá. O refrão anda à volta de qualquer coisa do género os políticos não valem nada, o país está a ir ao fundo. Soluções, deve haver, embora as não saiba. É um Dr. House, sem terapêuticas para salvar o doente. Temos de produzir mais e consumir o que pudermos é uma mensagem do senso comum que não necessitaria ser dita por um professor, economista e com outros títulos. Mas quando fala em produzir, apenas se refere a batatas e couves, numa visão muito rural do problema. Tecnologia não parece dizer-lhe nada. À primeira vez, o espanto colhe-nos pelo insólito; à segunda ainda sorrimos, pela traquinice; mas depois, o cansaço instala-se e resta-nos a visão condescendente de que estamos perante o bobo da SIC. Sem medidas e com pouca carreira.

segunda-feira, agosto 31, 2009

Costumes

Por agora, a diferença aparente é a modernidade e a tradição. A política é de costumes e a Economia não é tema. Só que no final de cada mês, mais que os costumes, é a Economia que impera. Mas manda o marketing que se mostrem as diferenças e nalgumas coisas as igualdades gritam. Se calhar nas mais fundamentais. Começo a pensar que mais coisa menos coisa, acabarão em união de facto abençoados pelo Papa e sem direito a separação.

domingo, agosto 30, 2009

Também o vento leste

Nos Estados Unidos, foi por já ninguém suportar mais o discurso guerreiro da mentira e pelo trambolhão económico em que caíram com a ilusão do fim do Estado. No Japão, onde são teimosos e tementes ao poder como os burros, também hoje o Estado vai começar a existir mais um pouco, possivelmente.
São as duas maiores economias mundiais a perceberem o óbvio. Por cá anda a mentira travestida de verdade a tentar convencer-nos do contrário.

Obviamente, mais Estado

À estafada cantiga do menos Estado, bom seria que outros o afirmassem, promovendo o melhor Estado. A memória é curta ou a ambição excessiva e as saudades imensas, mas menos Estado foi o que permitiu a evolução recente da História, a roubalheira desenfreada do poder e seus amigos. É o menos Estado que encalhou recentemente a linha Saúde 24, o outsourcing incontrolável. Mas esta gente sem memória não aprende, ou não quer aprender, governados que estão pelo desejo inconfessado do regresso à liberdade individual dos mesmos de sempre, gerador da opressão do mesmo colectivo conhecido. Melhor Estado, como já se vai tendo, quando as certidões são passadas na hora, quando se espera menos por consultas e cirurgias, quando mais jovens são educados mais tempo. Melhor Estado necessário, quando a Justiça for acelerada, dependendo menos das artimanhas processuais de advogados privados, quando se simplificarem processos na busca da eficiência. Melhor Estado fundamental, quando houver Imprensa independente, não controlada pelo poder económico, debitadora de um pensamento único.
Duvido da bondade dos homens, individualmente considerados. Se isso ainda puder ser dito e fazer sentido. Obviamente, é necessário mais Estado.

sexta-feira, agosto 28, 2009

A fuga dos médicos

A empresa GlobalMediRec colocou um anúncio no portal da Ordem dos Médicos para contratar 15 clínicos portugueses para hospitais públicos ingleses, pagando entre 6750 e 7900 euros brutos por mês. Médicos e sindicatos alertam para o perigo de muitos profissionais abandonarem o País numa altura em que também faltam recursos nas nossas unidades de saúde Publicado em DN de hoje com alarme e comentários de fazer chorar a rir.
Muitos profissionais abandonarem o país!!? De acordo com a própria notícia, serão 15!! Ainda há poucos dias foram recrutados uns 40 e tal cubanos... para virem trabalhar em Portugal. Este pânico da saída para os privados é recorrente, como se os privados fossem tão pouco criterioso como os serviços públicos na gestão dos recursos. Trata-se do mercado, estúpidos! Ou como diria o PM, são as novas oportunidades.

domingo, agosto 23, 2009

O vale tudo da alta competição

O jamaicano que voa não será o mais importante do actual campeonato do mundo de atletismo. A revelação, uma vez mais, da ausência de ética do «desporto» de alta competição será o factor mais marcante destes jogos. Há uma menina de 18 anos, que perante todo o mundo vê o seu género sexual ser posto em causa. Como isto é diferente dos cuidados que temos, naturalmente, perante uma jovem adulta com síndrome de insensibilidade aos androgénios, por exemplo. Apesar de atleta, por trás disso há uma pessoa. Mas parece que a este nível, apenas existem, resultados, promoções de marcas e as pessoas, na verdade, pouco contam.

sábado, agosto 22, 2009

Simplex informativo

Caiu uma arriba no Algarve, obviamente, por culpa do governo. Tenho quase a certeza que, se nesta altura houvesse um atentado que destruísse a ponte sobre o Tejo, a imprensa não hesitaria em condenar o Governo pela falha numa qualquer medida de prevenção. Dificilmente, nesse caso se poderia assacar alguma responsabilidade à alternativa aos males da terra, o Hospital de Santa Maria. E não sendo esse o culpado, restava o outro. Expressamente, a imprensa simplex: então já sabiam há dois anos e nada?

sexta-feira, agosto 21, 2009

Território

No início havia os ares, as terras e os mares e nenhum registo predial atribuía a alguém cada uma das suas partes. Depois, possivelmente, pelo medo das fomes ou então pela malvadez da natureza humana, essa realidade ainda inexpugnável, tudo passou a ficar delineado em confrontações referenciadas por pedras colocadas nas pontas do mundo de cada qual. Nasceram os vizinhos, as fronteiras e as guerras também para desenvolver a economia e dar consistência ao sistema. Com certeza, que os homens aprenderam isto na escola dos cães.
Foi o dia adequado para ver The Visitor, um exercício de reflexão sobre a América cercada por medos internos e intensos, negando a sua maior virtude, a tolerância dos estranhos.

quinta-feira, agosto 20, 2009

Jesusalém

Havendo uma história para contar é possível escrevê-la, mas disso pode apenas resultar um livro policial ou um best-seller, quando se anda na televisão. Diferente será fazer um livro de contos ou um romance. Para isso não basta haver uma história apenas, tem de haver também a escolha das palavras que a contam. Podem imaginar-se as palavras todas emaranhadas dentro de uma enorme caixa, a caixa das palavras, coberta por um pano preto, por onde entram mãos sábias na busca das melhores palavras. Quando as mãos são realmente sábias, as palavras saem lá de dentro alinhadas num texto que mostra os cheiros, as cores, as texturas, um mundo todo novo e inesperado. Um romance deve nascer como uma escultura, da pedra, pela eliminação da pedra excedente. Ao fim de muito martelar fica a maciez da forma capaz de encantar os olhos.
É também disto que as férias se fazem, do tempo de leitura. Nestas fui levado a Jesusalém (Mia Couto) numa viagem parecida com outra há já muitos anos, também numa praia, quando apreciei igualmente surpreendido a lisura do texto da construção do convento de Mafra. Agora, senti-me menino à volta da fogueira, em noites quentes com silêncios de rastos de bichos e luzes lá no alto, muito longe. Os romances permitem sentir o rigor da extração da pedra supérflua. Nada têm que ver com os best-sellers.

terça-feira, agosto 18, 2009

Tempo esticado

Na maioria dos dias vamos andando no tempo e acontece-nos chegar ao fim do dia sem ter percebeido o caminho que fizemos nele, como se não tivésemos saído do mesmo lugar no passeio que nele se faz.
Nas férias, ao fim de uns dias, acontece um tempo diferente, o tempo de férias. Chega-se às 2 da tarde, encontra-se a vizinha que vem a chegar e digo, bom-dia com a sensação de serem 11 da manhã. O tempo esticou. Estou de férias, então. Sem qualquer necessidade de relógio.

segunda-feira, agosto 17, 2009

A economia nas Caldas

Ao lado fica um prédio já em pré-ruína na ferrugem dos vãos e nas paredes a descascar. Era antiga fábrica. Subsiste apenas um amplo espaço onde os restos das colecções ainda vão preenchendo prateleiras entre outras já vazias. As peças expostas a preços de oferta têm pressa de sair dali. Existe essa pressa no ar e até no olhar ainda sorridente da funcionária e no outro mais cansado do segurança sentado lá num canto junto à porta. Há uma súplica de esvaziamento em tudo isto. Uma vontade de fim neste resto de memória de uma empresa produtora de cerâmica, exportadora, geradora nesses tempos de receitas para o lado certo da balança comercial.
A pouca distância ergueu-se um modernaço shopping-center de arquitectura viva, preenchido de loja e de gentes ambulantes frente às montras. Um eucaliptal de comércio a secar o tradicional da rua das Montras. na sua pujança criou emprego. Talvez alguns tenham até transitado da Secla ali ao lado. As lojas são as mesmas de sempre com os nomes ingleses e italianos que os donos espanhóis lhes puseram. Tudo a gerar receitas para a coluna errada da balança comercial.
Esta tem sido a história económica deste país nos últimos anos. A destruição da produção e a implementação crescente do consumo num país entregue às vedetas do alterne PS-PSD/CDS. Estas são as políticas que, realmente, hipotecam o país.

domingo, agosto 16, 2009

Com Sul e sem sol

Dois dias depois, começo a ter saudades do sol. Sobretudo por estar a ler o Sul do Miguel Sousa Tavares. Fico envergonhado ao perceber que a escrita pode fazer-nos sentir o sol, mesmo quando no texto sobressai um elitismo, talvez bem intencionado. Tendencioso, com certeza, quando em Cabo Verde ouve gritar os golos do FCP. O que eu vi foram as bandeiras do Benfica! São os caminhos diferentes que nos mostram mundos diversos.

sexta-feira, agosto 14, 2009

Greve

Estar de férias é ficar num sítio diferente. Aqui tem-se essa ilusão, ouve-se inglês nas falas dos vizinhos e sente-se a humidade do nevoeiro. Fico longe das notícias do país ainda que dentro dele. De férias foi o sol para parte incerta.

quinta-feira, agosto 13, 2009

CV

Missão cumprida. Um texto pequeno a resumir uma vida. Bastaram duas dúzias de páginas e fica tudo contado por agora. Um dia logo se vê.

quarta-feira, agosto 12, 2009

Sem saudades

Saio de Lisboa, 2ª circular fora, contemplando à força os enormes anúncios do CDS/PP. E penso que já sou suficientemente velho para ter conhecido uma sociedade, onde os professores eram os únicos a ser respeitados nas aulas e os polícias eram os únicos detentores do poder. Invocar esta mudança, não me causa saudades.

segunda-feira, agosto 10, 2009

Até aquece quando arrefece

Portugal cada vez mais quente e menos chuvoso
O Verão está com ares de Primavera, especialmente nas manhãs e noites ventosas, e os veraneantes andam algo inquietos com a "partida" climatérica. E têm razão. Houve dias de Primavera mais quentes. As temperaturas médias de Julho foram mais baixas do que os valores normais de 1971-2000, segundo o Instituto de Meteorologia. A máxima registou uma diminuição de 0,5ºC e a mínima de 1,2ºC. E também choveu mais do que seria normal, especialmente nas regiões do Noroeste

Extraído do Público de hoje.
Há jornalistas tão ligados à ideia do aquecimento global, que, para eles, quer a temperatura aumente, quer desça, é sempre a aquecer.

domingo, agosto 09, 2009

Mudança

Fica-se estranho quando se olha a nova imagem, mesmo quando se percebe já se ter sido assim há muito tempo. É uma surpresa que acompanha o alívio de uma imagem que atormentava de alguma forma todos os dias, quando pela manhã a olhava no reflexo do espelho.
Num tempo em que a imagem comanda o mundo, a mudança permite a ilusão de enganar o tempo.

sábado, agosto 08, 2009

Que continue a ser feliz


Acontece-me às vezes as palavras conterem o próprio riso. Raul Solnado, são duas palavras que sempre associei ao riso, à boa disposição, à normalidade de estar vivo, porque era como os demais, especial sem ser mourinho. Hoje, pela primeira vez, verifiquei que o riso também pode morrer nas palavras que o tinham. Parece que disse um dia que desejava ter como epitáfio Aqui jaz Raul Solnado (contra sua vontade). Deve ser tranquilo morrer bem-humorado, sem qualquer medo da morte, porque se teve o cuidado de viver. Mas por que são estes os que partem?

quarta-feira, agosto 05, 2009

Elegia

De um instante para o outro todo a certeza do tempo se transforma e o tempo seguro é um tempo esvaído no tempo. As expectativas do tempo associadas à estatística são definitivamente traiçoeiras e, afinal, o tempo só existe na esperança de vida, que, felizmente, nos casos concretos nada tem a ver com a estatística.
Poderá ser redutor, mas Elegia,foi sobretudo esta mensagem.

terça-feira, agosto 04, 2009

A paz ao terceiro dia

Ser conhecedor em Medicina é também ter senso clínico na determinação do prognóstico. Se não devemos ser ladrões da esperança, também é fútil a persistência em sermos deuses salvadores a todo o custo. A teimosia salvadora perante um prognóstico sem esperança pode mesmo chegar a ser má prática. Pior ainda é quando se tentam envolver outros técnicos na atitude de teimosia sem sentido, despertando sentimentos de culpa por acção e inacção. Cria-se uma dinâmica de silêncio e revolta em todos e nos próprios familiares, que, por fim quando alguém toma a decisão que se exigia, agradecem por lhes ter sido concedido o fim da dúvida e devolvido o direito do luto.
Ser médico, às vezes, é permitir que se morra, muito mais que a ilusão da ciência e a constatação da melhoria dos valores das análises. Porque o respeito pela vida pode ser, no seu limite, a concessão da morte.

segunda-feira, agosto 03, 2009

oração

deus me livre de o querer ser entre os homens. Delírios de grandeza que os tenham em privado sem afectar os pobres mortais. Ámen.

domingo, agosto 02, 2009

Definição de casal de periquitos

Parece que andam divididos os juízes do Tribunal Constitucional sobre os casamentos de gays.
Como diria, talvez, o Francisco Louçã, imaginemos um cenário: O Zé vai a uma loja de animais e pede um par de periquitos. O vendedor, perguntará, quer machos ou fêmeas? O Zé, responde um casal, se faz favor. Afinal o par era um macho e uma fêmea, um casal na linguagem do senso comum. Para o senso comum, realmente, um periquito e outro periquito são um par; uma periquita e outra periquita são também outro par; um casal de periquitos, é um periquito e uma periquita. Conclusão, dois periquitos do mesmo sexo, estão emparelhados; dois de sexos diferentes formam um casal.
Mas isso era no senso comum, pré-moderno. Agora, há quem busque confundir a linguagem.

sábado, agosto 01, 2009

Recusa da paz

Este mar que me acalma vai agora dourando na tarde não muito quente de um dia iniciado com chuva em Lisboa. Aqui saboreio a pausa e retempero. Há um silêncio com pássaros e saltos de coelhos apressados, agitações de vidas simples que fluem longe da cidade. Perante isto, fico espantado com o lamento de que Évora é um atraso, porque nem tem um templo Belmiriano do consumo progressista. Já chegámos à recusa da paz?

quinta-feira, julho 30, 2009

Cegueira

O título da notícia não informa. Sabe-se que de 6, três continuam sem ver, mas não se percebe na notícia, embora fosse admissível perante o título, se 3 recuperaram a visão. Poderia o título ser, então, 3 doentes recuperaram a visão? Nunca, porque a notícia tem de ser mensagem de desgraça, já que neste tempo das trevas e dos medos acabaram as boas-novas. Há um persistente esforço de indução de depressão, do medo, para que ao lado floresça a iniciativa privada sem denúncia pública. Se os bancos ganharam nos tempos de crise 4 milhões de euros por dia, isso não é notícia. Realmente, apenas é vergonha. A cegueira é muito mais generalizada do que é admitido, possivelmente contagiosa.

quarta-feira, julho 29, 2009

Cegos

Sem a pretensão elitista de reservar o complexo para os sobredotados, sempre me faz impressão quando vejo muita gente a ter opiniões sobre coisas complexas. Vivo num país de bocas grandes (não só a da MMG) onde muita gente gosta de grandes bocas e bocas sobre os mais diversos temas é coisa fácil de fazer, só que nada ou pouco valem. Mas vejo uma atracção imensa por se achar coisas sobre toda a coisa. É a opinião pública segundo se diz, esquecendo os que assim a chamam que a opinião pública tem um valor idêntico ao das mulheres públicas. Neste caso é também uma opinião frequentemente prostituída pela Informação, geralmente, privada. Ter opinião é coisa complexa e que dá trabalho, o que muitas vezes não faz as delícias dos opinadores compulsivos nem de quem os estimula a ter opiniões. Por isso, as coisas complexas têm de ser explicadas de forma simples por aqueles que as estudaram a fundo e isso leva tempo, um tempo demasiado grande para as necessidades jornalísticas destes tempos. Não se podem emitir opiniões a toda a hora e mais vale opinar no fim da história, mesmo que os noticiários fiquem entretanto vazios. É nessa altura que pode ser dita a verdade sobre a coisa. Mas a verdade parece ser o que menos interessa a jornalistas privados. Erro médico é um assunto demasiadamente sério para ser tratado por gente ligeira e apressada.

segunda-feira, julho 27, 2009

Anquilose sistémica

Corre-se o risco de que com a aprovação das futuras carreiras médicas, tudo vá continuar como até aqui. Nos últimos anos, o que se tem visto é uma tentativa sôfrega da parte das várias direcções da Ordem dos Médicos de controlar tudo o que respeita aos títulos médicos, deixando, de lado cada vez mais a apreciação das capacidades técnicas de forma objectiva, por exemplo, através de concursos periódicos ou por créditos de formação. Num país pequeno, com pouca gente, a preocupação é ter a capacidade de escolher as pessoas por critérios mais ou menso elásticos que, efectivamente, permitem uma grande dose de arbitrariedade. Actualmente, e nada faz prever diferenças para o futuro, chegam a confundir-se níveis de diferenciação com lugares de quadro. É disso prova a confusão de um título de provimento com um grau de carreira: o lugar de chefe de serviço ou futuro especialista senior parece ser um nível de carreira, mas é efectivamente um lugar do quadro e não mais que isso. O curioso é que sendo um lugar de quadro de uma organização se coloque a sua decisão ao critério de elementos de outras organizações concorrentes, como se isso não pudesse enviezar os resultados. É como se a equipa do Benfica fosse seleccionada pelos dirigentes do Porto e do Sporting!! Assobia-se para o lado e todas as consciências ficam tranquilas. Faz-se um exercício de grande rigor classificativo, recorrendo a grelhas de avaliação mais ou menos sofisticadas e tudo fica na paz dos resultados. O importante é ser o mais formal possível, depois, na prática, logo se espremem os pontos da grelha até que da tortura saia o resultado desejado. Umas vezes tudo termina numa almoçarada, outras no Tribunal Administrativo, para que tudo seja confirmado de acordo com a vontade do júri.
Para uma melhor produtividade das organizações faria, seguramente, mais sentido que os seus quadros de direcção sectorial fossem escolhidos por aqueles a quem vão reportar entre aqueles que tivessem as habilitações para o cargo, possivelmente, mais por critérios de funcionalidade do que por critérios pretensamente técnicos. Mas o mais curioso é que esta prosa não fará muito sentido a muitos burocratas do amen ao sistema. Nem perceberão o porquê destas coisas, alienados que estão.
Mas é assim que se têm criado os monstros disfuncionais que vamos tendo neste sistema anquilosado de serviços.

domingo, julho 26, 2009

Bloco de notas

Depois fico calado uns dias, ainda na esperança de encontrar a frase que fugiu. Ainda por cima era a que tinha graça,a que valia a pena. Andam por aí muitíssimas dessas, das que valem a pena e não registei no momento exacto. Preciso de um bloco de notas, que me evite os silêncios impostos pela espera das que fugiram. De outra forma, apenas saem estas. A memória é um carcereiro cada vez com mais tempo de férias e é dessa forma que as frases livres se vão safando do registo.
A memória pouco realiza, mas é um instrumento indispensável para embelezar o discurso e o tornar mais apetecido e compreensível. Uma espécie de esqueleto do corpo do pensamento. Sem ela resta-nos um discurso invertebrado, mole e rastejante.

quarta-feira, julho 22, 2009

Médicos livres

Com um ar atlético de quem procura o petróleo em alto mar, queixa-se de astenia. Fico com a impressão de que mais do que a eventual falta de hormona de crescimento, o cansaço lhe vem do medo do futuro. Vai desfolhando papéis na minha frente e as suas dúvidas da vantagem de consultar várias opiniões médicas. No meio desses papéis vejo um orçamento de prováveis despesas com uma intervenção cirúrgica a fazer nos Estados Unidos. Discriminada por actos desde consultas, blocos, honorários, tudo somado são 160000 dólares!! Felizes os médicos que não têm de gastar o seu tempo a fazer orçamentos... à maneira dos pato-bravos!
A liberdade da acção de ser médico não tem preço, mas isso só é possível onde se perceba que a saúde não é um negócio.

segunda-feira, julho 20, 2009

Comunicação

É possível que seja mais tolerável estar sem comer do que sem a possibilidade de comunicar. É isso que talvez explique que desde a invenção da roda sempre o esforço dos homens tenha, em grande parte, sido criar instrumentos que permitam e facilitem a comunicação e que todos os grandes avanços da Humanidade estejam de alguma forma ligados à comunicação. Curiosamente, as riquezas pessoais e dos povos estão também ligadas à comunicação. Aconteceu aos portugueses nos Descobrimentos, acontece com a criação dos caminhos de ferro, com as auto-estradas e, mais recentemente, com as telefónicas e a Internet. Sempre esta necessidade de interagir e a negação do isolamento. O problema é que, a comunicação é um instrumento e não um fim. Tanto pode usar-se para aproximar, ajudar, promover como simplesmente para convencer, ludibriar, tirar proveito. Nela se baseia o domínio do mundo.
Nada, pois, será possível fazer para impedir a disseminação da gripe, porque o isolamento seria fatal.

sábado, julho 18, 2009

engripAdos

É notável o esforço dos trabalhadores da Direcção Geral de Saúde à volta da gripe A. É a demonstração da superioridade dos serviços públicos na área da saúde. Será também de apreciar o esforço financeiro das autoridades ao subsidiarem o tratamento e a quimioprofilaxia da doença. É outra demonstração da inevitabilidade do sector público dominante no que à saúde respeita.
Perante esta realidade custa perceber a impreparação e o pânico de alguns funcionários na forma como lidam com os doentes e os contactos dos doentes. Gripe quase todos vamos ter e, quando muito, teremos de tomar alguns paracetamois até ficarmos bem de novo. A histeria mediática, uma vez mais, assusta em vez de esclarecer, porque o esclarecimento não vende o que o susto consegue. Por momentos, seria bom que se suspendesse o lucro como única prioridade. Mas isso nunca será uma prioridade dos privados. É compreensível, mas ensinador.
Temos a gripe em casa. Sobreviveremos sem dramas.

sexta-feira, julho 17, 2009

Mau cheiro


Este é claramente um cartaz inspirado em momentos da vida real. Assim que a Judiciária disse ao senhor Oliveira e Costa, mãos ao ar, está preso!, a ideia instalou-se nas hostes. Agora aí andam eles de mãos e braços no ar, em grande labor de nada dizer para não sair mentira. Daí também a história da política de verdade. Fossem dizer alguma coisa do que queriam e, ou era suicídio, ou teria de ser mentira, daí o seu silêncio. Nunca baixamos os braços é também a expressão de quem nunca trabalhou seriamente ou de maneira inteligente. É mais ergonómico trabalhar de braços para baixo respeitando a anatomia, a gravidade e a circulação. Finalmente, a expressão é preocupante, porque esta posição incómoda e mantida acabará como já se vai notando a causar mau cheiro no ambiente.

quinta-feira, julho 16, 2009

Pessoal


Têm andado vazios os dias como acontece sempre que apenas a rotina os vai enchendo. Passam e nós vamos andando. Agora, porém, algo aconteceu no parto de uma impressora. A partir de uma minúscula foto possivelmente feita a la minute, passando por uma digitalização e uma impressão, eis que nasceu, para meu primeiro conhecimento, a D. Deolinda do Outeiro. Esta senhora é, para mim, a origem possível e localizada do mundo. Antes dela nada me é conhecido. Quase que se consegue adivinhar a serenidade na determinação e ainda há um esboço de sorriso. Hoje, assim, nasceu a minha bisavó pelo milagre possível da fotografia. A imortalidade possível.

quinta-feira, julho 09, 2009

O regresso da via láctea

Já no caminho de regresso, noite dentro, percebi que um destes dias a via láctea voltará de novo. Lá, no silêncio da planície, depois das nuvens de estorninhos conformarem o fim do dia.
É um tempo que urge e cada vez mais próximo.

Gestão corrente na Estação Estúpida

Quando agora falo com eles, sinto que há um hiato no ar à espera de Setembro. Estas pessoas estão meio adiadas numas férias forçadas de acção. Adiam as pontes, os comboios e os aeroportos, mas também as pequenas decisões de um hospital. É a gestão corrente da táctica de como se vai sobreviver na incerteza do que por aí virá.
Subitamente, a D. Manuela surpreende e diz que concorda com todas as políticas do governo, confirmando que as duas faces do jogo de alterne são, afinal, iguais e que só os actores justificam tanta guerra mediática. Até Setembro, para tudo ficar na mesma com actores diferentes, eis a questão.

segunda-feira, julho 06, 2009

O elogio da imbecilidade

Quis ver as notícias mas apenas davam a festa do Real Madrid. Três televisões ligadas em directo em tempo de pretenso noticiário promoviam a marca RM e a marca CR. Chegámos a isto: milhões especados frente ao génio. Assim, por momentos, todas as crises caem por terra, somos orgulhosamente patriotas, os maiores. Isolado, num canto, há quem resista a este destino e não compre o elogio da imbecilidade.
Para amanhã o menú está também garantido. A minha dureza de ouvido não me permite lembrar de nenhuma das suas músicas. Recordarei apenas a cara de um exótico bailarino em permanente metamorfose.
A indústria do entretenimento a atenuar a realidade que se nega e se substitui pela imagem virtual. São estes os modelos dos tempos actuais, o vazio como objectivo.

domingo, julho 05, 2009

A dupla perda e a dor de corno


Ser político exige obediência a um conjunto de normas de bom comportamento no registo do politicamente correcto, a primeira das quais é a recusa da autenticidade e o sacrossanto sacrifício à imagem conveniente. É curioso como os cidadãos, preferem o artifício e a mentira simulada de verdade, a um gesto de autenticidade fora das normas convencionadas. São espectadores e exigentes preferindo ser enganados a verem alguma realidade dita menos própria. E depois há políticos que o são incidentalmente e podem com alguma facilidade recorrer a algum argumento menos adequado dentro da cartilha e sofrem as consequências. De há muito que se não discutem ideias, mas as virtudes necessárias à arte de ser político. Afinal, até há quem não precise de ser político e cansado da coisa até possa ser menos polido. Depois, as virgens púdicas do nacional-jornalismo e do nacional-politiquismo, logo vêem fazer a algazarra do costume. Num instante, tudo pára. Tudo não, muita eólica continua a rodar apesar de ter gritado de forma gestual que a berraria política de alguns mais não era que dor de corno. E é mais um a abandonar a cena para que os profissionais certinhos continuem na sua senda de virgens puras. É uma dupla perda, mas a culpa é nossa.

segunda-feira, junho 29, 2009

Jardim & Madoff

Não seria de esperar que alguma vez o PR criticasse o génio, que foi buscar em tempos a Madrid: Jardim Gonçalves, um quase salvador da pátria. Parece que ainda agora merece andar guardado e viajar em jacto privado tudo pago pelos accionistas do BCP, o banco modelo que tanto tem produzido para bem de todos nós. Estes visionários têm de ser bem protegidos.
Outros que tanto e tão depressa fizeram avançar o liberalismo recentemente são condenados a penas impossíveis por muitos esquemas piramidais que inventem. A morte será ainda o limite mais democrático e igualitário para todos, embora neste caso pudesse ser adiada para manter o símbolo bem vivo durante muitos e muitos anos. Mas seria também importante e da mais elementar justiça que os que lhe estiveram mais próximos não beneficiassem de alguma forma com o crime. Até para que ele visse alguma da ruína que induziu, mas sobretudo para que outros investidores e criativos da gestão se inibam de ser tão geniais.
Importante também seria que tivesse sido condenado a não escrever as memórias ou a qualquer outra forma de transformar a desgraça em benefício. Mas isso também seria pedir demais a um sistema que, na verdade, até lhe reconhece alguns méritos. E, qual hidra, o sistema mantém-se...

domingo, junho 28, 2009

Enxerto de passado recente

Não me enganava no último post. À chegada a questão magna era a ida de Obama com a Michele ao teatro em véspera de falência da GM, como se um luto resolvesse alguma coisa do que o liberalismo desenfreado dos agora críticos tinha determinado. É uma estratégia bem conhecida que lembra o caso BPN: também aí se tenta tapar a asneira dos fraudulentos com a falta de eficácia do regulador, como se o ladrão pudesse ser perdoado porque o polícia não previne o crime. Dentro quase do registo conhecido de que roubar só é crime quando se é apanhado, no mais é iniciativa privada de boa qualidade e geradora de valor para a organização.
Mas estava de férias e estas coisas tinham de ser relativizadas.
Chegar à noite a Washington e ir para o hotel pode não ser fácil, quando apenas se dispõe de uma orientação Googlearth do trajecto a partir do aeroporto: o rent a car fica afastado e tudo fica modificado no plano. Vai-se então, à maneira antiga, de estação de serviço em estação de serviço sendo-se (des)orientado pelos residentes. Mas acabamos sempre por chegar ao destino.
O dia seguinte acordou pardacento e chuviscoso, mas foi mau tempo de pouca dura. Logo à saída de DC, o sol já brilhava e a jornada foi longa, à volta de 1000 km num dia é obra, sobretudo quando se decide intervalar a I-95 e ir mais à beira mar. São umas 3 vias duplas costa abaixo, quase paralelas, numa abundância de estradas que ainda agora se contestam como investimento lá do outro lado, onde por acaso, nascemos. Por aqui andaram escravos em tempos que foram, hoje persistem outros um pouco menos, mas não é este o padrão de gente americana que encontramos nas fitas do Império. As casas frágeis prontas à renovação no próximo tornado. Nas pessoas raras que se encontram, lá estava uma que sabe associar o nome de Ronaldo a Portugal. Este país reduzido a isto... Bom mesmo é sentir a ausência e a insignificância de MMG, Sócrates e outros tão importantes na pequenez do além-mar.
Já bem no escuro, entrámos, finalmente, no passado de Savannah.
No dia seguinte começámos a perceber que esta é uma terra passada renovada, um quadrado de ruas e praças encostado ao rio. A rua empedrada à beira-rio de onde já saíram os eléctricos que aí deixaram as linhas e por onde agora passam autocarros em forma de eléctricos. O calor húmido no limite do tolerável, a convidar sempre a entrar nas lojas. Vamos seguindo as sugestões e entrando nas casas-museus, onde os guias nos vão contando sempre as histórias curiosas de vidas que nos esqueceremos muito em breve, ficando a lembrança da prosperidade de outros tempos alicerçada no import-export do algodão e no trabalho escravo. Dos fracos não reza a história ou quando muito ficam imagens que a evocam ao mesmo tempo vão perdendo significado com o decorrer dos anos.
Sabe bem o refresco das praças arborizadas, onde agora descansam os descendentes dos que outrora fizeram a cidade e daqui a uns anos lembrar-me-ei da comida do sul na mesa colectiva no Wilkis, à porta do qual pela uma da tarde se forma fila na Jones St e, enquanto s espera, se vai assistindo à saída dos que, mais ou menos barrigudos, nos incitam a não desistir de esperar. Vale a pena, dizem. Mais logo seremos nós também a dizê-lo.
E há algum mistério, histórias de fantasmas e uma estranha calmaria à noite, onde parece que a cidade fecha pelas 10 pm. Arriscámos o jazz do Jazzed como nos recomendaram, mas apenas nos serviram folk a acompanhar as tapas, que justificam a deslocação se nos esquecermos da música.
De Savannhah ficará também a recordação da câmara fotográfica esquecida no Dot, o transporte público para turistas, que funciona a partir das 10 am. Circula pela zona histórica (Historic District) da cidade parando aqui e além. Depois de sair, senti a falta da Canon para registar o Market e lá fui a correr atrás do Dot, animado pelas paragens frequentes nos sinais vermelhos. Só que a cada arranque no verde, me faltava a força nas pernas, que logo ressurgia no vermelho seguinte. Percebi nesse exercício que a força está, certamente, mais na cabeça do que nas pernas. E finalmente, a história acabou bem. Ao fim de mais um circuito pela cidade, pude ver a câmara deixada no segundo banco do Dot. Recuperação com palmas dos turistas em circuito. Mais do que a perda da máquina que me acompanha desde a Nova Zelândia, era o trabalho de quase um dia que se perdia.
Ao fim de 2 dias, já pouco há a fazer na cidade além de perceber que é bem maior do que o turista vê no centro histórico e como turista bem orientado pelos Lonely Planets fomos até Tybee (que significa sal na língua original) e hoje é acumulação de praia e hotel com um jetty a lembrar-nos outras paragens e companhias de viagem. Os mundos vão sendo todos muito semelhantes, muitas vezes a diferença dos instantes são os amigos com quem os percorremos.
De Savannhah até Orlando é um tempo de ligação que se poderia bem melhor fazer por translocação futurista. Nada a registar, excepto a visão das nuvens carregadas à entrada do estado do sol e a confirmação da chuva na chegada a Orlando. Por Orlando passámos também, vendo ao longe mais uma das skylines sempre idênticas desta terra. Finalmente, o Grand Vaccances Hilton, confortável e igual a tantos outros locais de repouso pseudo-sofisticados. Repouso na véspera da ida às brincadeiras de infância que sabem ainda bem nos tempos de agora. O mundo do senhor Walt é isso mesmo, sendo agora possível perceber que Paris e quejandos são amostras para abrir o apetite à casa mãe. Há para todos os gostos, mar, futuro e magia servidos sempre da mesma forma descontraída, organizada e obrigatoriamente feliz. Um dia só nos permitiu optar pela Magia e lá andamos entre a Branca de Neve e o Peter Pan, por montanhas russas tenebrosas e salpicos de água refrescantes. A paisagem humana é aqui diferente de Paris: os americanos mascaram-se dos heróis para virem ao Reino da Magia e deslocam-se aqui para celebrar os mais variados eventos. Irritação só mesmo à saída. Ao dirigir-mo-nos para o barco que nos havia de levar ao monorail e como gente normal ensaiámos uma passagem sobre uma corrente que nos evitava mais um precurso de uma centena de metros. Logo uma senhora rosnou um sonante there is a reason for the chain!! Ela acredita que há, porque alguém lhe disse que havia. Mas ela não sabia nem desta razão nem de todas as razões que lhe dizem que há para não fazer as mais variadas coisas. Deve ser fácil governar uma gente assim, que nunca pergunta o porquê das correntes e das cadeias. Gente que parte para guerras em locais que desconhece e tolera Guantanamos porque mais do que o temor a uma divindade, aceitam os dogmas dos governantes sem pestanejar e afirmar convictos, afinal, que há uma razão para as correntes e cadeias. Ninguém lhe spergunte qual, porque não sabem. Pior, nem entendem o significado da pergunta. Aliás, quem a fizer deve ser ou talibã ou no mínimo comunista.
Depois do incidente não o céu, mas as nuvens caíram-nos em cima da cabeça e do corpo todo. Era o prenúncio do clima dos dias seguintes.
No dia seguinte, o time-sharing roubou-nos a manhã antes de seguirmos mais para o sul. O suficiente para inviabilizar a visita ao Kennedy Space Center. Da porta ainda avistámos foguetões e o space shuttle. Fica para a próxima na esperança de ter sido a única perda do dia.
Pelo sul abaixo, há um contínuo de praias mais ou menos privadas, com casas particulares sobre a areia e impossibilidade do comum dos mortais chegar à água. Numa tentativa desesperada passámos pela Fonte da Juventude em St Augustine. A água bebemos, mas os resultados devem ser os que teve o inicial descobridor e cada vez mais os senior moments se irão apoderando mais e mais de nós. Houve também o insólito de na beira da estrada se encontrar um casino com mais de 200 slot machines, gerido por uma confissão religiosa, da miríade de organizações destas que vamos encontrando a cada momento. Uma crise de fé geradora de muitas fés, ao que parece de duvidosa ética. Miami é quase no fim da estrada.
As sugestões dos livros de viagens resultam algumas vezes. Ficámos ao sul, em Coral Gables, algo que lembra Estoril-Cascais, num hotel velho e charmoso,cheio de história e encantos múltiplos. Do 10º andar do Biltmore avistamos a grandeza do campo de Golfe e um céu de chumbo quase a cair de novo. Soubémos no dia seguinte, que em Miami Norte os carros nadaram na enxurrada. Tudo acontece em meia hora, a chuva desaba e logo seca, religiosamente ao fim da tarde.
Na manhã seguinte, já voltou o céu absolutamente azul e o calor húmido. Antes que chuva volte, fomos a Key Largo e resistimos aos perto de 200 quilómetros de estrada sobre ilhas que leva a Key West, quase junto a Cuba. Era um desperdício de tempo de viagem na incerteza de haver uma balsa para rumarmos à Ilha...
Ficámos pelo mergulho a ver peixinhos, experimentando eu a angústia da desorientação e o sabor áspero da água na garganta. Alguém me fez sem barbatanas.
Miami depois foi a visão da praia, de uma costa estragada por grandes hotéis e finalmente com a descoberta de um resto de passado na zona Art Deco, obviamente só na arquitectura. De resto é a Ocean Drive para comer e a Collins para vestir. Nos pisos de cima das duas, descansa-se nas camas dos hotéis. É curioso que nesta ânsia de conservação politicamente correcta, acaba-se quase sempre por destruir as especificidades dos locais e torná-los iguais a tantos outros noutros sítios. Há alguma globalização na afirmação da originalidade local.
Mais própria a skyline que brota da Downtown e Little Habana onde se encontram cubanos desgostosos com a realidade da Ilha, aparentemente não muito bem de vida, perdidos na cidade de acolhimento. Em vários casos nem integrados na língua, apenas entendendo o castelhano.
Um último dia para sobreviver aos mosquitos do Jardim Botânico e passar por Vizcaya a contemplar glórias e passados de bem estar.
Antes do regresso a Washington, a experiência de um aeroporto onde se faz check-in na rua.
Em Washington já o tempo é de trabalho e menos de passeio. A cidade está mais aberta que há uns anos e por todo o lado há a glorificação de Obama. Ainda assim, Georgetown permitiu bons momentos de passeio e a passagem pelos memoriais não deixou de causar a estranheza da sua existência. Nomeadamente, não consigo perceber qual a glória dos americanos que morreram no Vietname. They never forget o quê? O erro de uma guerra onde se meteram contra o sentido da história? A sua derrota inglória? Provavelmente esqueceram ou pelo menos não aprenderam grande coisa com a história e lá vão saltando de Iraque em Afeganistão na construção de novos memoriais. Até quando?
E basta de intromissão do passado recente no presente.