Se estamos bem, podemos abster-nos; se estamos mal, devemos agir, realizar o bem. Ainda que nessa realização possamos fazer algo menos bom, pior seria ficar parado, inerte, porque o imobilismo não resolve o nosso incómodo de estarmos mal. Mesmo que agir, tenha quase necessariamente que dar, a quem não age, a possibilidade de reagir contra toda e qualquer mudança. O estado de espírito dos descontentes apáticos, curiosamente, exacerba-se quando algo muda, mesmo que adivinhem que a mudança possa ser benéfica. Mas mudar tem sempre algum incómodo associado, algum dispêndio de energia. Isso explica, provavelmente, o horror à mudança. Nessas alturas é de esperar que os acomodados se inquietem e procurem denegrir quem age pela mudança. É da natureza das coisas.
Não são pois de estranhar as campanhas mais ou menos espontâneas, de denúncia de quem se empenha na acção. Os políticos são umas das vítimas desta natureza das coisas. Aqui também e muito mais pelo horror a tudo o que é público, pois são eles os gestores dessa coisa. No primado do interesse próprio, chega a ser curioso que invocando princípios éticos se denunciem os pecados dos políticos. É, seguramente, correcto denunciá-los, mas estranha-se que, ao mesmo tempo, se não faça a denúncia dos não políticos que têm como único real valor a promoção pessoal em detrimento do bem comum. Quem sabe se essa não é uma arma do liberalismo para dissimular a ferocidade do interesse próprio, desviando a atenção para a observação e crítica da acção dos que se dedicam à causa comum. Por exemplo, se um gestor de uma empresa privada tiver um vencimento mais ou menos pornográfico e simultaneamente tiver uma reforma de uma participação anterior num organismo público, isso terá o mesmo impacto de um gestor público ter um vencimento bastante mais baixo do que o privado e ao mesmo tempo receber uma pensão equivalente? Estou convencido que o ataque aos políticos, como a idolatria do futebol ou a frenética devassa da vida privada das celebridades são o ópio que o sistema instila para se poder manter mais tranquilamente no poder. Ou os cães ladram, fazem barulho, agitam as matilhas e a caravana passa. Na verdade, a ausência de ética é uma das referências do liberalismo.
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