quarta-feira, janeiro 03, 2024

SOS SNS

Na terra dos apaixonados que nunca experimentaram, ouvimos as opiniões que têm, só porque lhes contaram. São crentes, sempre prontos a espalhar a fé que lhes pregam. E fazem-no com a convicção dos pregadores, por exemplo, daquelas que de microfone apertado na mão ali à porta das urgências dos hospitais anunciam a sua verdade, gritando mais do que muitas parturientes no ato que as levou ali. Lá dentro há a tranquilidade com que agora se resgata o que esteve guardado nove meses e que até já parece rir pelo meio de algum choro que anuncia vitalidade. Mas à porta da urgência a gritaria é aflita. Não sei quantas horas de espera, aqui 15, no Porto são só 2. Até dá para apanhar o Alfa e ir à invicta, carago!

Assim, uma legião de não conhecedores da realidade das urgências ou da assistência nos serviços públicos, acredita que o SNS está completamente decrépito. Para o descrédito, contribuem a quase generalidade dos políticos, ávidos ou da facilidade dos votos ou envolvidos na promoção ativa dos negócios privados da doença.
Na verdade, das hordas que vão às urgências só uma ínfima minoria ali deveria ir à semelhança do que acontece nos países civilizados. Aqui, criado que foi o hábito desde sempre e por todos os governos, de não haver acesso à medicina de proximidade nos cuidados primários, subalternizando-se os cuidados à loucura do hospitalocentrismo, ainda se não se experimentou ir onde se deve quando se tem tosse ou doi a barriguinha cheias de sonhos e coscorões. E parece que algum acesso se tem criado, nos tempos mais recentes. Parece que à maneira do Norte onde a espera é mais curta… Há que experimentar, mas vai levar tempo. A ansiedade e gritaria que aí vai é capaz de traduzir o receio de que as coisas melhorem por aqui e lá se vai o negócio da saúde privada, que segundo uma notável gestora, será o terceiro mais rentável depois da droga e da guerra.
Mas ao lado da desgraça de quem nunca praticou, há uma certa confiança e aprovação dos praticantes. Todos já ouvimos alguém falar da excelência de atendimento nos serviços públicos, da simpatia e competência dos seus vários profissionais. Mas isso só está ao alcance de quem pratica, o que não é o caso da maioria dos palradores. Por outro lado, não há informação validada sobre o que se passa na presumida excelência dos cuidados privados, cujos créditos se manifestam logo que se lá entra pela exigência de apresentação dos respetivos cartões… de crédito.
Como experiência pessoal, testemunho que das vezes que recorri aos serviços públicos, fui atendido e tratado com toda a amabilidade e eficiência. Acaba-se vivo.
A experiência que tive num hospital privado foi de aluguer de instalações para uma intervenção delicada, isto é, toda a equipa médica deslocou-se de Santa Maria para lá executar o procedimento. Beneficiário da ADSE (devo fazer parte do terço de portugueses que se considera ter um seguro de saúde) quis saber quanto me iria custar o procedimento, alguns meses antes. Criada uma expectativa de pouco mais de uma dezena de milhar de euros, perante a minha insistência em ter uma estimativa rigorosa, fui procurando uma resposta definitiva que só veio dois dias antes de marcada a intervenção e inflacionada para o quádruplo da conversa inicial. Nesta coisa da saúde, não há tempo para pedir mais orçamentos a outras entidades e, quando é possível, avança-se e o pagamento é feito, não como nas oficinas de automóveis quando se vai buscar viatura, mas à cabeça (devem ter medo de causarem uma avaria definitiva e já não haver quem pague a conta…) Acontece que o tal seguro que tenho acabou por só comparticipar cerca 10% dos custos. Neste sistema acaba-se quase ou mesmo falido.
Fica o registo, como aviso, para os ansiosos do Sistema Nacional de Saúde. Todo o cuidado é pouco e tudo tem de ser feito na melhor gestão do SERVIÇO Nacional de Saúde para que este nunca acabe. O SNS é a grande manifestação e demonstração prática da liberdade conquistada há quase 50 anos.

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