Regressámos à normalidade, ao nível onde geralmente vivemos, apesar de se observarem algumas resistências, algo induzidas, aqui e além. É este o tempo de se reflectir sobre o que aconteceu.
Numa pequena região da Europa, há um país de resistentes como nas histórias do Astérix. Um grupo de tipos desenrascados, algo brigões, alguns dos quais caíram no caldeirão quando eram pequeninos e são a chamada geração de ouro. Nesta terra há duas realidades, uma que é a mais abominável de todas chamada trabalho e organização e outra que é o super-valor que é a capacidade de desenrascar a coisa. Esta segunda mostra uma das grandes características destas gentes, a sua inteligência superior, isto é, a possibilidade de resolverem os problemas com que se vão deparando, de forma bastante eficaz.
Às vezes conseguem iludir-se completamente nuns acesso de fé em que atingem os objectivos antes de lá chegarem. Nos últimos anos, instituíram um reforço desta estratégia de funcionamento mental com a ajuda dos meios de comunicação. São os chamados 15 minutos de fama. Vem-se do quase nada, é-se promovido de forma exaustiva pelos meios de informação, com as televisões com papel dominante, até se atingirem níveis muito altos de glória e sonho provocando-se, desde Timor, uma estimulação de adesão popular a esta forma de estar, que se exalta até ao limite. É o esquema Big brother em marcha. Depois, bem depois, os Zés Marias não se aguentam e a queda é a pique. Pelo meio fazem-se preces, promessas, bruxedos se necessário. Desta vez, houve superstições com gravatas, gente que via os jogos só em determinados sítios, outros que nem os podiam ver por darem azar. Subconscientemente, parece que se não acredita, por isso se apela à ajuda do sobrenatural, não será? A sorte que é precisa por o trabalho, talvez, não ter sido suficiente. Como os alunos que não estudam a matéria toda e vão ao exame confiando na sorte de terem estudado as partes que vão sair...com os resultados habituais a seguir. Sinceramente, custa-me a crer que se deva à sorte perder duas vezes em casa contra a mesma equipa, mas sou mau analista. Espero pelos comentários do Professor Marcelo.
E depois do acidente? Procura-se, claro, o culpado. O culpado é um tipo que nos dias anteriores era quase santo, mas que rapidamente vira uma besta e com o passar dos dias a coisa vai agravar-se, sobretudo, quando, daqui a algum tempo, surgir outro deslize. Deus ou Diabo desta história se há-de tornar.
Afinal o que se passou não era assim tão importante. Era uma competição de futebol entre selecções que presumivelmente o praticam bem por serem as melhores da Europa. Portanto, seriam de esperar bons jogos. A coisa esteve bem organizada (só três dias depois dos peritos da UEFA terem elogiado a organização, os nossos políticos, perante a derrota, realçaram este facto; até aí era necessário não falar em trabalho, optava-se pela cor das gravatas da sorte), não houve ataques terroristas nem acidentes estranhos, os árbitros actuaram bem, reinou o fairplay, foi até uma festa bonita, quase desportiva. Pena foi a despropositada hipertrofia do entusiasmo, que nada justificava. Realmente, seríamos hoje melhores se tivessemos ganho, seria isso tão importante? Era com isso que curávamos os males de que sofremos ou seria, eventualmente, o contrário por isso nos afastar ainda mais das soluções? Em resumo, o futebol é um jogo com algum interesse estético, mas a alegria e sofrimento que determina nos que o vêem continuam hoje a ser, como ontem eram, alienação, catarse. E não será por isso, que estes fenómenos são promovidos até limites da irracionalidade pelos donos do poder?
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