terça-feira, maio 04, 2004

Relações

O maior poder é ficar com a sensação de que se não usa todo para que o outro possa ter o seu, mesmo quando o nosso é bastante maior que o dele. O doente sempre está nesta relação na posição de baixo. O saber, pretensamente, no médico, dá-lhe poderes. Dosear este poder e transformar a relação em confiança, é o que se deve exigir a quem domina. Exigir ao doente que assine uma declaração a dizer que se responsabiliza pelo não internamento é muitas vezes fruto de uma realção episódica, em que não houve tempo suficiente para se criarem laços de confiança. Creio que ninguém gostará de o fazer e só numa sociedade de intolerância tal será possível. O risco partilhado, porque de um e outro lado há bons motivos para assumir as atitudes que se tomam, é a solução mais gratificante e responsabiliza ambas as partes. A sensação que dá é que o doente vai para casa mais bem tratado do que ficaria se fosse internado. Mais não seja porque não foi violentada a sua vontade com a prepotência do poder do médico. Nesses momentos, a relação assume uma dimensão de grandeza que satisfaz, não angustia.
E fica a ausência de remorsos por se não ter condenado à fome o cão sozinho em casa. Aconteceu-me hoje, pela segunda vez, uma doente não poder ser internada por ter um cão sozinho em casa. Amor com amor se paga.

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