A afixação das listas de devedores ao condomínio no hall de entrada dos prédios já não é o que era dantes. Passar-se-á o mesmo com a lista de devedores às finanças. O que era uma vergonha intolerável nos tempos em que havia vergonha, passa agora a ser informação privilegiada para uma melhor gestão das despesas. Funciona assim: se eu devo 100, mas sei que há outros que devem 500, então a atitude certa é não pagar os 100, porque, se o fizer, estou a pagar para os que devem 500 poderem usufruir do que pagam os pagantes! Portanto, a lógica é ser devedor enquanto se puder.
É o que tinha de acontecer depois de se ter desvalorizado a honra, acabado com a vergonha e feito subir ao máximo do valor o primado das garantias do indivíduo, o tal que, embora vivendo com outros, tem o máximo direito à sua afirmação individual, qual leão na savana. Criou-se, para sua garantia, um sistema de justiça em que chamar-lhes filhos da puta é punível por lei e acabou-se com aquele expediente mais simples de resolução de conflitos que era, simplesmente, ir-lhes à cara.
O problema maior é que esta realidade ao nível do indivíduo se impôs também ao nível dos Estados, em que há uns que impõe lógicas próprias a outros, sem a necessidade de recorrerem a processos dolorosos como as guerras. Ou melhor utilizando guerras politicamente corretas.
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