Ao considerar-se a Saúde como mercadoria, isto é, como um valor trocável, sujeito à compra e venda de acordo com as leis de oferta e da procura em Sociedade de Mercado, esquece-se uma especificidade fundamental da sua natureza: ao contrário da maioria das outras mercadorias, esta, naturalmente, ninguém a quer consumir, todos dispensariam gastar dinheiro na sua aquisição, impõe-se-nos o consumo sem a pressão do marketing. Por isso, alarmamo-nos quando nos anunciam o fecho de urgências, quando nos colocam o posto de recurso a mais alguns quilómetros, mesmo que toda a racionalidade e eficiência justifiquem essas medidas.
A Saúde surge-nos como uma necessidade e um direito, não como um luxo de consumo. No entanto, cada vez mais a pressão liberal desvirtua a realidade do que se sente naturalmente. Hoje existe um marketing potente de estímulo ao consumo da Saúde, aproveitando o conhecimento do sentimento do direito que a ela temos. Essa pressão exige um combate sério e aplicado. A pressão tecnológica que faz disparar as despesas exige uma atitude responsável dos agentes, responsabilizadora de quem lhes pagam e igualmente a auto-responsabilização dos beneficiários, os utentes. Não parece decente assistir-se com serenidade à realidade de uma sociedade que induz ao consumo, que gera patologia e ao mesmo tempo à proliferação dos meios de diagnóstico e tratamento que visam atenuar e corrigir o que primariamente seria evitável. Evitável pela organização social menos indutora de consumos desnecessários e pela atitude responsável dos consumidores. Concretizando, que justificação para todos pagarem as despesas com o cancro do pulmão, quando é bem sabido que se não combatem eficazmente as tabaqueiras e os fumadores não tomam uma atitude responsável de prevenção? Ou as despesas do politraumatizado que conduz sob efeitos de álcool ou de drogas? Ou dos diabéticos, que se alimentam de forma desregrada, quem sabe por se não combaterem as cadeias de comida rápida ou os pré-cozinhados ou os estilos de vida que roubam todo o tempo para se cozinhar tranquilamente e comer bem e de forma saudável? Ou, ou, ou (um infinito de possibilidades).
O direito à saúde deve ser universal, por isso ao Estado compete actuar de forma eficaz na prevenção da doença criando as condições para que os cidadãos vivam saudáveis. A estes compete também serem responsáveis nas suas escolhas, pois só dessa forma a gratuitidade será justificável.
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