quinta-feira, junho 01, 2006

Segurança anti-social

Tinha um ar aliviado nas palavras, mas alguma tristeza nos olhos. Tristeza ou remorso, não percebi bem. Anunciava-me, talvez, pela décima vez que tinha entregue a papelada para se reformar usando o sentido de oportunidade que é acessível aos que nasceram até ao ano certo. Fazendo-o agora, conseguia ter cerca de 2500 euros, amanhã ninguém sabe quanto seria, por isso vamos antes que se faça tarde. O incómodo existia, pois foi-lhe necessário dizer que não era propriamente uma pensão milionária. Deixou-me a meditar nestas coisas da segurança social e na facilidade com que se usam palavras simpáticas para designar exactamente o contrário. Segurança social, imaginava eu, diria respeito a manter os cidadãos de uma comunidade preservados do meio hostil, isto é, dar-lhes uma casa, cuidados de saúde, alimentação e por aí adiante. Acho que esta realidade não rima bem com pensões que ultrapassam, como tem sido descrito nos jornais, mais de 10 vezes o ordenado mínimo. Traduzo, há uns tipos que têm de trabalhar quase durante um ano para obter o que outros conseguem, num mês, a descansar, (os quais tinham passado a vida a descontar mensalmente, enquanto trabalharam, aproximadamente um mês de vencimento dos outros). Ou seja, este comportamento anti-social já vem de longe. Porque muitas vezes, já a força se lhes foi e mais não conseguem que ir passando o tempo de forma a não desarranjar de vez o coração, os pulmões e outras peças, mais não conseguirão do que acumular capital sem proveito próprio. Assim, a segurança social destes milionários das reformas nem sequer é a deles, é a dos filhos e sobrinhos, os quais, em grande medida, já dela não careciam também, por terem tido possibilidades de formação e ocupação que os isentaram do risco social. Por ironia, poderão mesmo estar nos lugares onde se decide a segurança social. Francamente, isto parece-me tudo muito pouco social e mais, não me garante segurança nenhuma, diria mesmo que terá de acabar em barricada um destes dias.

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