quinta-feira, julho 30, 2009

Cegueira

O título da notícia não informa. Sabe-se que de 6, três continuam sem ver, mas não se percebe na notícia, embora fosse admissível perante o título, se 3 recuperaram a visão. Poderia o título ser, então, 3 doentes recuperaram a visão? Nunca, porque a notícia tem de ser mensagem de desgraça, já que neste tempo das trevas e dos medos acabaram as boas-novas. Há um persistente esforço de indução de depressão, do medo, para que ao lado floresça a iniciativa privada sem denúncia pública. Se os bancos ganharam nos tempos de crise 4 milhões de euros por dia, isso não é notícia. Realmente, apenas é vergonha. A cegueira é muito mais generalizada do que é admitido, possivelmente contagiosa.

quarta-feira, julho 29, 2009

Cegos

Sem a pretensão elitista de reservar o complexo para os sobredotados, sempre me faz impressão quando vejo muita gente a ter opiniões sobre coisas complexas. Vivo num país de bocas grandes (não só a da MMG) onde muita gente gosta de grandes bocas e bocas sobre os mais diversos temas é coisa fácil de fazer, só que nada ou pouco valem. Mas vejo uma atracção imensa por se achar coisas sobre toda a coisa. É a opinião pública segundo se diz, esquecendo os que assim a chamam que a opinião pública tem um valor idêntico ao das mulheres públicas. Neste caso é também uma opinião frequentemente prostituída pela Informação, geralmente, privada. Ter opinião é coisa complexa e que dá trabalho, o que muitas vezes não faz as delícias dos opinadores compulsivos nem de quem os estimula a ter opiniões. Por isso, as coisas complexas têm de ser explicadas de forma simples por aqueles que as estudaram a fundo e isso leva tempo, um tempo demasiado grande para as necessidades jornalísticas destes tempos. Não se podem emitir opiniões a toda a hora e mais vale opinar no fim da história, mesmo que os noticiários fiquem entretanto vazios. É nessa altura que pode ser dita a verdade sobre a coisa. Mas a verdade parece ser o que menos interessa a jornalistas privados. Erro médico é um assunto demasiadamente sério para ser tratado por gente ligeira e apressada.

segunda-feira, julho 27, 2009

Anquilose sistémica

Corre-se o risco de que com a aprovação das futuras carreiras médicas, tudo vá continuar como até aqui. Nos últimos anos, o que se tem visto é uma tentativa sôfrega da parte das várias direcções da Ordem dos Médicos de controlar tudo o que respeita aos títulos médicos, deixando, de lado cada vez mais a apreciação das capacidades técnicas de forma objectiva, por exemplo, através de concursos periódicos ou por créditos de formação. Num país pequeno, com pouca gente, a preocupação é ter a capacidade de escolher as pessoas por critérios mais ou menso elásticos que, efectivamente, permitem uma grande dose de arbitrariedade. Actualmente, e nada faz prever diferenças para o futuro, chegam a confundir-se níveis de diferenciação com lugares de quadro. É disso prova a confusão de um título de provimento com um grau de carreira: o lugar de chefe de serviço ou futuro especialista senior parece ser um nível de carreira, mas é efectivamente um lugar do quadro e não mais que isso. O curioso é que sendo um lugar de quadro de uma organização se coloque a sua decisão ao critério de elementos de outras organizações concorrentes, como se isso não pudesse enviezar os resultados. É como se a equipa do Benfica fosse seleccionada pelos dirigentes do Porto e do Sporting!! Assobia-se para o lado e todas as consciências ficam tranquilas. Faz-se um exercício de grande rigor classificativo, recorrendo a grelhas de avaliação mais ou menos sofisticadas e tudo fica na paz dos resultados. O importante é ser o mais formal possível, depois, na prática, logo se espremem os pontos da grelha até que da tortura saia o resultado desejado. Umas vezes tudo termina numa almoçarada, outras no Tribunal Administrativo, para que tudo seja confirmado de acordo com a vontade do júri.
Para uma melhor produtividade das organizações faria, seguramente, mais sentido que os seus quadros de direcção sectorial fossem escolhidos por aqueles a quem vão reportar entre aqueles que tivessem as habilitações para o cargo, possivelmente, mais por critérios de funcionalidade do que por critérios pretensamente técnicos. Mas o mais curioso é que esta prosa não fará muito sentido a muitos burocratas do amen ao sistema. Nem perceberão o porquê destas coisas, alienados que estão.
Mas é assim que se têm criado os monstros disfuncionais que vamos tendo neste sistema anquilosado de serviços.

domingo, julho 26, 2009

Bloco de notas

Depois fico calado uns dias, ainda na esperança de encontrar a frase que fugiu. Ainda por cima era a que tinha graça,a que valia a pena. Andam por aí muitíssimas dessas, das que valem a pena e não registei no momento exacto. Preciso de um bloco de notas, que me evite os silêncios impostos pela espera das que fugiram. De outra forma, apenas saem estas. A memória é um carcereiro cada vez com mais tempo de férias e é dessa forma que as frases livres se vão safando do registo.
A memória pouco realiza, mas é um instrumento indispensável para embelezar o discurso e o tornar mais apetecido e compreensível. Uma espécie de esqueleto do corpo do pensamento. Sem ela resta-nos um discurso invertebrado, mole e rastejante.

quarta-feira, julho 22, 2009

Médicos livres

Com um ar atlético de quem procura o petróleo em alto mar, queixa-se de astenia. Fico com a impressão de que mais do que a eventual falta de hormona de crescimento, o cansaço lhe vem do medo do futuro. Vai desfolhando papéis na minha frente e as suas dúvidas da vantagem de consultar várias opiniões médicas. No meio desses papéis vejo um orçamento de prováveis despesas com uma intervenção cirúrgica a fazer nos Estados Unidos. Discriminada por actos desde consultas, blocos, honorários, tudo somado são 160000 dólares!! Felizes os médicos que não têm de gastar o seu tempo a fazer orçamentos... à maneira dos pato-bravos!
A liberdade da acção de ser médico não tem preço, mas isso só é possível onde se perceba que a saúde não é um negócio.

segunda-feira, julho 20, 2009

Comunicação

É possível que seja mais tolerável estar sem comer do que sem a possibilidade de comunicar. É isso que talvez explique que desde a invenção da roda sempre o esforço dos homens tenha, em grande parte, sido criar instrumentos que permitam e facilitem a comunicação e que todos os grandes avanços da Humanidade estejam de alguma forma ligados à comunicação. Curiosamente, as riquezas pessoais e dos povos estão também ligadas à comunicação. Aconteceu aos portugueses nos Descobrimentos, acontece com a criação dos caminhos de ferro, com as auto-estradas e, mais recentemente, com as telefónicas e a Internet. Sempre esta necessidade de interagir e a negação do isolamento. O problema é que, a comunicação é um instrumento e não um fim. Tanto pode usar-se para aproximar, ajudar, promover como simplesmente para convencer, ludibriar, tirar proveito. Nela se baseia o domínio do mundo.
Nada, pois, será possível fazer para impedir a disseminação da gripe, porque o isolamento seria fatal.

sábado, julho 18, 2009

engripAdos

É notável o esforço dos trabalhadores da Direcção Geral de Saúde à volta da gripe A. É a demonstração da superioridade dos serviços públicos na área da saúde. Será também de apreciar o esforço financeiro das autoridades ao subsidiarem o tratamento e a quimioprofilaxia da doença. É outra demonstração da inevitabilidade do sector público dominante no que à saúde respeita.
Perante esta realidade custa perceber a impreparação e o pânico de alguns funcionários na forma como lidam com os doentes e os contactos dos doentes. Gripe quase todos vamos ter e, quando muito, teremos de tomar alguns paracetamois até ficarmos bem de novo. A histeria mediática, uma vez mais, assusta em vez de esclarecer, porque o esclarecimento não vende o que o susto consegue. Por momentos, seria bom que se suspendesse o lucro como única prioridade. Mas isso nunca será uma prioridade dos privados. É compreensível, mas ensinador.
Temos a gripe em casa. Sobreviveremos sem dramas.

sexta-feira, julho 17, 2009

Mau cheiro


Este é claramente um cartaz inspirado em momentos da vida real. Assim que a Judiciária disse ao senhor Oliveira e Costa, mãos ao ar, está preso!, a ideia instalou-se nas hostes. Agora aí andam eles de mãos e braços no ar, em grande labor de nada dizer para não sair mentira. Daí também a história da política de verdade. Fossem dizer alguma coisa do que queriam e, ou era suicídio, ou teria de ser mentira, daí o seu silêncio. Nunca baixamos os braços é também a expressão de quem nunca trabalhou seriamente ou de maneira inteligente. É mais ergonómico trabalhar de braços para baixo respeitando a anatomia, a gravidade e a circulação. Finalmente, a expressão é preocupante, porque esta posição incómoda e mantida acabará como já se vai notando a causar mau cheiro no ambiente.

quinta-feira, julho 16, 2009

Pessoal


Têm andado vazios os dias como acontece sempre que apenas a rotina os vai enchendo. Passam e nós vamos andando. Agora, porém, algo aconteceu no parto de uma impressora. A partir de uma minúscula foto possivelmente feita a la minute, passando por uma digitalização e uma impressão, eis que nasceu, para meu primeiro conhecimento, a D. Deolinda do Outeiro. Esta senhora é, para mim, a origem possível e localizada do mundo. Antes dela nada me é conhecido. Quase que se consegue adivinhar a serenidade na determinação e ainda há um esboço de sorriso. Hoje, assim, nasceu a minha bisavó pelo milagre possível da fotografia. A imortalidade possível.

quinta-feira, julho 09, 2009

O regresso da via láctea

Já no caminho de regresso, noite dentro, percebi que um destes dias a via láctea voltará de novo. Lá, no silêncio da planície, depois das nuvens de estorninhos conformarem o fim do dia.
É um tempo que urge e cada vez mais próximo.

Gestão corrente na Estação Estúpida

Quando agora falo com eles, sinto que há um hiato no ar à espera de Setembro. Estas pessoas estão meio adiadas numas férias forçadas de acção. Adiam as pontes, os comboios e os aeroportos, mas também as pequenas decisões de um hospital. É a gestão corrente da táctica de como se vai sobreviver na incerteza do que por aí virá.
Subitamente, a D. Manuela surpreende e diz que concorda com todas as políticas do governo, confirmando que as duas faces do jogo de alterne são, afinal, iguais e que só os actores justificam tanta guerra mediática. Até Setembro, para tudo ficar na mesma com actores diferentes, eis a questão.

segunda-feira, julho 06, 2009

O elogio da imbecilidade

Quis ver as notícias mas apenas davam a festa do Real Madrid. Três televisões ligadas em directo em tempo de pretenso noticiário promoviam a marca RM e a marca CR. Chegámos a isto: milhões especados frente ao génio. Assim, por momentos, todas as crises caem por terra, somos orgulhosamente patriotas, os maiores. Isolado, num canto, há quem resista a este destino e não compre o elogio da imbecilidade.
Para amanhã o menú está também garantido. A minha dureza de ouvido não me permite lembrar de nenhuma das suas músicas. Recordarei apenas a cara de um exótico bailarino em permanente metamorfose.
A indústria do entretenimento a atenuar a realidade que se nega e se substitui pela imagem virtual. São estes os modelos dos tempos actuais, o vazio como objectivo.

domingo, julho 05, 2009

A dupla perda e a dor de corno


Ser político exige obediência a um conjunto de normas de bom comportamento no registo do politicamente correcto, a primeira das quais é a recusa da autenticidade e o sacrossanto sacrifício à imagem conveniente. É curioso como os cidadãos, preferem o artifício e a mentira simulada de verdade, a um gesto de autenticidade fora das normas convencionadas. São espectadores e exigentes preferindo ser enganados a verem alguma realidade dita menos própria. E depois há políticos que o são incidentalmente e podem com alguma facilidade recorrer a algum argumento menos adequado dentro da cartilha e sofrem as consequências. De há muito que se não discutem ideias, mas as virtudes necessárias à arte de ser político. Afinal, até há quem não precise de ser político e cansado da coisa até possa ser menos polido. Depois, as virgens púdicas do nacional-jornalismo e do nacional-politiquismo, logo vêem fazer a algazarra do costume. Num instante, tudo pára. Tudo não, muita eólica continua a rodar apesar de ter gritado de forma gestual que a berraria política de alguns mais não era que dor de corno. E é mais um a abandonar a cena para que os profissionais certinhos continuem na sua senda de virgens puras. É uma dupla perda, mas a culpa é nossa.