Estar fora contém os riscos de não ter assistido a bons momentos cá dentro. Ouvidos de longe ficam mais ténues as emoções, mesmo quando se adivinham alguns renascimentos. Literalmente, parecia andar tudo aos berros como sempre deve acontecer nas casas onde o pão escasseia. Felizmente, não houve tempo para ir comentando os rumores. Lá fora, Portugal é um sussurro bem distante. Chegado a 15, foi o motorista do táxi que nos foi dizendo que lhe parecia que havia uma revolução. Sempre exagerados estes motoristas.
Andei perdido pelos caminhos da ética e da natureza de que todos somos feitos. Continuo perdido, mas à procura. Na ida os jornais espanhóis falavam da tristeza do Cristiano Ronaldo. O jovem anda triste e as causas do tédio são ocultas, como ocultos são os negócios (os dele e os dos outros) que têm por alma, o segredo. E são assim todos os negócios. Corrupto não é não fazer o ato proibido, porque já se é quando se faz sem a interdição do ato. E não pagar impostos é tão bom, não é? Mas a lista não acaba aí...
Miami confirma a ideia, na exuberância dos corpos, na sonoridade, na languidez do néon noite avançada. Passam Rolls Royce na Collins enquanto deitados nos cartões os contemplam alguns descartáveis nos jardins na câmara ardente das noites que se sucedem aos dias. Quanto caminho andado até aqui! Quanta natureza «humana»! Há uma ilha onde moraram mafiosos. E agora, quem mora lá? Alguns são celebridades... que a linguagem sempre vai mudando.
As visitas seguintes às cidades devolvem-me sempre diferentes paisagens depois de passada a necessidade de conhecer o imediatamente desconhecido. Mais ou menos, chego à conclusão que as cidades americanas são todas iguais. Uma extensão vasta de casas de madeira com uma ereção central de betão do distrito financeiro. A linha do céu a tentar fazer esquecer o inferno das periferias. Miami tem a Calle 8, onde cubanos se sentem americanos, perdido que foi o grande orgulho de terem um país diferente ali bem perto. Sentem-se bem, deixai-os estar e assim estivessem todos de um lado e do outro do mar. Por preconceito, se calhar, acho mais bonitos os de além mar.
Uns dias de vadiagem pela praia, pela recordação de Coral Gables e pelo Bayside, as compras feitas, já apetecia fazer a «inutilidade» dos 200 km até Key West. Um lugar especial povoado pelo fantasma de Hemingway, a proximidade presente de Cuba e o ritual do pôr do sol num fim de tarde de calor úmido.
Finalmente, a Disney em Orlando para arregalar os olhos a um puto giro de 9 meses e tal. Uns olhos que olham mesmo que ainda não vejam, que nós só vemos o que recordamos e ali o olhado é instantâneo. Colorido e sonoro. Tudo seguido com grande atenção. Afinal, até os adultos não desgostam do folclore da magia.
Orlando original visitada à noite por indicação de um velho guia. Church Street Station ou o som e a luz do Cais do Sodré do outro lado do mar. A América oculta sempre à mostra.
E o regressar mais longo porque o piloto da Ibéria teve um achaque e os humanos também erram. Miami-Lisboa em 24 horas.
E à chegada ainda o rescaldo do anúncio de que a história ainda não acabou e se a soubermos continuar o fim será bonito, pá! Já o tem sido algumas vezes, embora com reveses a seguir, mas o caminho está aí na procura do sol que há-de um dia nascer. Até porque não vale a pena ser de outra maneira...