domingo, abril 30, 2006

Música e imagem


Espero que ninguém me volte a dizer que os fármacos para a obesidade devem ser comparticipados. Posso reagir mal, se souber que ainda não são comparticipados os cuidados continuados. Cuidado!
Apesar de tudo, tem sido simpático verificar que de alguma forma as coisas se vão fazendo. Juntas de Freguesia que cedem camas articuladas, serviço social com capacidade de apoio domiciliário, medicina familiar com consultas domiciliárias. E ninguém dizia nada, envoltos que andam entre importantes celebridades e campeonatos mundiais de glorificação da Pátria. É um mundo estranho este, alienado da realidade, devorado por sonhos.
Num certo torpor que sempre me deixam as perturbações do sono, o dia vai correndo, tendo por fundo a Paixão de São Mateus e recordações de Picasso ainda jovem.

sábado, abril 29, 2006

Lição

Afinal, 81 anos depois e à medida que conseguiu eliminar os tóxicos, ao fim da tarde, lá voltou abrir timidamente o olho, naquela atitude de olho que não olha, só procura. Como 81 anos antes, possivelmente. Embora sem a esperança de então. E, durante a noite, resmungou e revoltou-se, arrancou a sonda nasogástrica, disponibilizando-se para engolir.
Se pensarmos bem, é em casos como este, que o risco de errar é, ainda assim, mais pequeno. Este caso de «sucesso» é bem a demonstração de que os exames curam bem menos que o bom senso. Num doente previamente já agitado, não é muito necessário procurar as causas que já eram conhecidas, em busca de uma probabilidade reduzida de surpresa, tanto mais que essa procura não é inócua e, aliás, se existisse, teria algum efeito prático na história natural da decisão? Trata-se de um frenesim de busca de prova que fará mais sentido noutras artes, seguramente a evitar nesta que é muito especial, imprópria para cientistas curiosos e pesquisadores do exótico. A vida, é uma coisa simples se a não complicarmos, o problema é que na ânsia idiota de ser diferente, somos educados para a excepção, para a raridade e aos poucos vamos esquecendo a média de que somos feitos. Depois, todos sabemos que no meio é que está a virtude, não é?

sexta-feira, abril 28, 2006

quinta-feira, abril 27, 2006

Eis a questão

A questão é, será preferível fazer a coisa certa, com a consciência de estar a fazer a coisa errada, ou fazer a coisa errada consciente de estar a fazer a coisa certa? Por estranho que pareça, a minha opção é peça segunda, mais não seja porque o erro é humano, como será igualmente a consciência tranquila.
E sobretudo não é decente comer sopa, quando se está em coma.

quarta-feira, abril 26, 2006

Alcatruzes

Pela memória das coisas, acreditamos na circularidade do ocaso e do renascer, nestes alcatruzes da vida, como ouvia quando era ainda criança.

terça-feira, abril 25, 2006

Carnaval fora de época


É triste que neste dia tenhamos ouvido um Presidente que não usando a máscara do cravo (e ainda bem que assim se não conspurcam os símbolos), usou um discurso mascarado: Quero propor um compromisso cívico, um compromisso para a inclusão social, um compromisso que envolva não só as forças políticas, mas que congregue as instituições nacionais, as autarquias, as organizações da sociedade civil, dos sindicatos às associações cívicas e às instituições de solidariedade".
Foi triste que em dia de memória se tenha lembrado de retomar a campanha eleitoral. Ainda falta muito para o segundo mandato e sempre que este não político abre a boca (podia ter continuado com o silêncio) a Grândola sai-lhe desafinada, um falsete. Nem o otorrino do Porto lhe poderá valer, o defeito é estrutural e irreparável.
Também triste foi não o ouvir sobre o trauliteiro da Madeira, que hoje não ofendeu o Senhor Silva, mas a memória de toda uma gente, que não deveria ter de o aturar. Talvez porque ambos gostem de se mascarar em dias de festa. Mas esta terra merece mais que Carnaval.

domingo, abril 23, 2006

Fim de tarde

Bem-estar, mal-estar. Não usar o nosso mal-estar para o bem-estar dos outros. A generosidade de algumas pessoas não tem limites, deveria ser delas o bem-estar. Saber que não acontece assim, perturba ainda mais o bem-estar dos que o têm. Numa forma de mitigar o mal-estar, para sabermos que não há mundos perfeitos.

sábado, abril 22, 2006

Drug dealers

Médico ou drug dealer, temos de decidir.

Para quem estiver interessado, pode aqui ser consultada a referência feita ontem.

Imagem de Anthony Flores, do referido artigo.

sexta-feira, abril 21, 2006

Haja doenças!

Cada vez temos mais publicações para o público em geral a falar de temas de saúde. Sob a capa da promoção da informação da saúde, de um modo geral, há um incentivo ao consumo de cuidados e de medicamentos, muitas vezes com interesse pelo menos duvidoso. Está na moda a divulgação de doenças que afectam multidões crescentes de indivíduos, parecendo que se quer fazer de cada pessoa um doente. (talvez devesse ser mais exigente e escrever cliente, porque é disso que se trata). Será possível escapar simultaneamente a ser obeso, ter hipertensão, ser fumador, ter osteoporose, ter colesterol alto, ser diabético ou simplesmenete, ter disfunção eréctil ou disfunção sexual nas mulheres? Se conseguir não ter nenhuma dessas, terá certamente depressão... Ainda escapou? Não tem problema, a demência acabará por o apanhar! Ou seja, de uma ou outra forma, acabar-se-á sempre por ter indicação para comprar uma das últimas drogas que a Indústria farmacêutica generosamente anda a investigar para nos prolongar a vida até aos 200 anos.
Desde há uns tempos para cá, prevenção das doenças é continuar a ter maus hábitos (comer a gordura do Império, estar sentado o dia todo, viver em stresse nas empresas, não ter horários de trabalho, não ter espaço para pensar, ficar esparramado em frente do telejornal do crime) e depois usar drogas. Recentemente, na Austrália, um estudo de David Henry e Ray Moynilhan, apresentado numa conferência médica referiu que as grandes empresas são responsáveis por muitas prescrições desnecessárias de medicamentos. Mas, mais grave do que isso, chegam ao ponto de promover tratamentos para doenças cuja existência nem sequer está comprovada. Não será novidade, mas é bom que seja dito. E já agora que se pense no papel que nisto pode ter, o facto de a investigação ter saído completamente da alçada do Estado e ter sido entregue completamente a interesses privados, onde as conclusões dos estudos podem ser fabricadas de acordo com as necessidades das cotações das empresas que as promovem. Com a privatização do conhecimento, resta aos cidadãos serem consumidores, voatarem nos eleitos das companhias de tempos a tempos e continuar a pagar. Alienados da verdade.

quinta-feira, abril 20, 2006

Casino

A partir de ontem Lisboa tem um Casino. Para quem possa interessar (parece que 1-3% dos indivíduos que residem na proximidade de casinos) aqui fica, transcrito do DSM-IV:

Critérios Diagnósticos para F63.0 - 312.31 Jogo Patológico

A. Comportamento de jogo mal-adaptativo, persistente e recorrente, indicado por cinco (ou mais) dos seguintes quesitos:
(1) preocupação com o jogo (por ex., preocupa-se com reviver experiências de jogo passadas, avalia possibilidades ou planeja a próxima parada, ou pensa em modos de obter dinheiro para jogar)
(2) necessidade de apostar quantias de dinheiro cada vez maiores, a fim de obter a excitação desejada
(3) esforços repetidos e fracassados no sentido de controlar, reduzir ou cessar com o jogo
(4) inquietude ou irritabilidade, quando tenta reduzir ou cessar com o jogo
(5) joga como forma de fugir de problemas ou de aliviar um humor disfórico (por ex., sentimentos de impotência, culpa, ansiedade, depressão)[586]
(6) após perder dinheiro no jogo, freqüentemente volta outro dia para ficar quite ("recuperar o prejuízo")
(7) mente para familiares, para o terapeuta ou outras pessoas, para encobrir a extensão do seu envolvimento com o jogo
(8) cometeu atos ilegais, tais como falsificação, fraude, furto ou estelionato, para financiar o jogo
(9) colocou em perigo ou perdeu um relacionamento significativo, o emprego ou uma oportunidade educacional ou profissional por causa do jogo
(10) recorre a outras pessoas com o fim de obter dinheiro para aliviar uma situação financeira desesperadora causada pelo jogo.
B. O comportamento de jogo não é melhor explicado por um Episódio Maníaco.

Hipótese

Possivelmente, uma explicação para não agir ou para ter dúvidas antes.
O mundo é de quem não sente. A condição essencial para se ser um homem prático é a ausência de sensibilidade. A qualidade principal na prática da vida é aquela qualidade que conduz à acção, isto é, a vontade. Ora há duas coisas que estorvam a acção - a sensibilidade e o pensamento analítico, que não é, afinal, mais que o pensamento com sensibilidade. Toda a acção é, por sua natureza, a projecção da personalidade sobre o mundo externo, e como o mundo externo é em grande e principal parte composto por entes humanos, segue que essa projecção da personalidade é essencialmente o atravessarmo-nos no caminho alheio, o estorvar, ferir e esmagar os outros, conforme o nosso modo de agir.

Para agir é, pois, preciso que nos não figuremos com facilidade as personalidades alheias, as suas dores e alegrias. Quem simpatiza pára. O homem de acção considera o mundo externo como composto exclusivamente de matéria inerte - ou inerte em si mesma, como uma pedra sobre que passa ou que afasta do caminho; ou inerte como um ente humano que, porque não lhe pôde resistir, tanto faz que fosse homem como pedra, pois, como à pedra, ou se afastou ou se passou por cima.

Fernando Pessoa, in 'O Livro do Desassossego'

quarta-feira, abril 19, 2006

Privatizemos o Parlamento!

(Os deputados (alguns!) foram de escapadinha, mas não escaparam!)
Neste país onde ninguém faz pontes, onde toda a gente entra a horas e sai depois de ter feito tudo aquilo que podia fazer em cada dia, neste país onde a produção é o que se sabe, onde tanta gente abdica de férias em nome do trabalho, onde ninguém se reforma enquanto consegue trabalhar, há finalmente um escândalo que se lamenta: os deputados foram de férias um dia mais cedo!
Bolas, os tipos que já são dos poucos que têm os impostos em dia, ganham miseravelmente, quando comparados com o CEO do Millenium (670 ordenados mínimos por mês!!!!), agora não podem baldar-se um dia? Será que tudo isto é porque são uma espécie de funcionários públicos? Claro, que se a Assembleia da República subcontratasse uns quantos empregados a uma empresa privada para fazerem o trabalho de deputados, tudo correria sobre rodas, trabalhariam sem horários nem garantias e todos ganharíamos, que os gajos, na sua fúria liberal, fariam todas as leis necesárias para nos tratar de vez.

Dogmas e dúvidas

Sempre foi um defeito de juventude que me acompanhou, esta minha dificuldade em separar os bons dos maus. Muitas vezes olho para a bondade dos maus e a maldade dos bons e a decisão fica difícil. Este anti-maniqueísmo apenas complica a vida, reconheço, mas está-me na natureza. Quando me falam de alimentos transgénicos tenho dessas crises de confiança. Fará talvez pouco sentido dizer aos indianos que comam cenouras para terem vitamina A em vez de culivarem arroz modificado que já a contém. Mas talvez não. Fosse a produção mais fácil, mais generalizada e não tão dependente das Monsantos e talvez o mundo corresse menos riscos e os povos tivessem menos fome. Torna-se urgente que gente mais normal, como os europeus, comecem a ter capacidade de criação e competitividade também nestes campos da ciência. Ideal mesmo seria que os indianos deste mundo, pudessem pensar no assunto.

domingo, abril 16, 2006

Páscoa

O dia de Páscoa era uma altura de juntar tios e primos e muitas vezes acabava em animados jogos de sueca.
Hoje voltou a ser um pouco disso. E foi também um passeio gigante entre os maracujás e a árvore do abacate. «Está um bocado amarelada!». Se calhar nem nunca deu abacates, pensei eu. Do amarelado da árvore fez-se a ligação ao esforço da mulher «mártir do trabalho» para manter as árvores verdes? Num reconhecimento de fragilidade assumida e doída. Por momentos, as ligações restabelecem-se, o discurso toma forma e tem sentido, orientação. Às pernas vem a energia necessária para ir fechar a porta lá do fundo. Como um sol que rompe as nuvens, surge fugazmente um sorriso aqui e além.

sábado, abril 15, 2006

Os amigos do Casimiro

O Casimiro reformou-se. Não sei se ele pode sentir, mas este almoço foi a confirmação que a obra se mantém ainda que o cepticismo venha por ondas afectar-nos. O Casimiro foi um ensinador de atitudes e muito mais que doenças, que também nos ensinou, fez-nos aprender os doentes. Inoculou-nos com essa necessidade como atitude permanente. Ainda hoje nos disse que um pastor que vem ao médico pedir um «Taco» é um sinal de alerta para doença grave, como o é, igualmente, a mulher que vem ter connosco para lhe tratarmos o marido. Porque uma mulher não delega o tratamento do marido sem mais nem menos, tem de ser grave. Quem ensina hoje que não devemos sentar-nos na cama do doente? Quem passa visita às 8 da manhã com as enfermeiras? Quem é o Director de Serviço que é o primeiro a entrar pela manhã e o último a sair ao fim da tarde?
O Casimiro merece estar reformado. Mais que não seja para, estando mais perto de nós, nos podermos encontrar de vez em quando a falar das desgraças dos Serviços, para nos sentirmos impotentes para transformar as grandes coisas, mas, ainda assim, sabermos resolver as pequenas coisas do nosso sítio. Porque há muita coisa que podemos fazer melhor, sem retórica, com medidas simples. Mesmo sem jogos de poder ou usando alguns dos poderes com que ele de alguma forma nos armou.
Foi boa a discussão sobre o acesso aos serviços, sobre os tempos de espera nas urgências. Fiquei a olhar a realidade de outra forma depois de nos ter dito daquela forma simples com que sempre diz as coisas, que tudo isto terá começado com o Serviço Médico à Periferia e depois a criação dos SAPs. Primeiro a generosidade de médicos jovens, depois o interesse, a utilidade das horas extra na composição do ordenado dos médicos, tudo isto reforçado pelo gosto dos autarcas em facilitarem o acesso quando, por exemplo, as costas doem. Sempre numa dinâmica de consumo, reforçada pela «informação» dos media, a divulgarem doenças e «negligências» sem parar, reforçando a procura de certezas nas análises e nos exames de imagem. Fez-nos lembrar que uma amilasemia era mais complicada de pedir do que uma TC do crânio, nos dias de hoje. O sistema favorece os autarcas e outros políticos, os médicos e os fornecedores, é quase um mundo perfeito, não fosse tão insuficiente para os doentes. E essa insuficiência provém de se ter destruído a relação natural que seria o doente falar com o seu médico de clínica geral quando, por exemplos, as costas doem. Será que se está agora no caminho certo por vias tortas? Estaremos a regressar ao papel central do clínico geral no sistema ou vamos destruir tudo o que ainda resta subordinados a interesses de seguradoras e banqueiros? Melhoramos muito realizando este SNS, nada do que hoje fazemos tem alguma coisa que ver com o que fazíamos. A nossa história é um caso de sucesso. Com custos que podem ser racionalizados, mas com a certeza, que destruir o que foi conseguido, será um retrocesso lamentável.
Aqui nasce um papel decisivo para a terceira geração que nos ouvia: impedir a destruição daquilo que andámos a fazer, inspirados, muitas vezes, no que o Casimiro nos ensinou.

sexta-feira, abril 14, 2006

Elogio do simples

Parece haver um novo-riquismo pró-complexo, um inaceitar do simples. Simples é pobre, dispensável como agora se diz. Ao mesmo tempo há um elogio permanente do natural, fartos que estamos da sofisticação complexa que criámos. Mas natural também deixou de ser o que a natureza nos dá, não mais umas couves ou batatas o são. Natural agora são algas e coisas que tais, que a ninguém lembraria comer, naturalmente. Foi assim natural que tivesse que percorrer algumas dezenas de metros de prateleiras de iogurtes, mais ou menos complexos, na loja do senhor Belmiro antes de encontrar o iogurte simples que procurava. E é claro que, há muito, o marketing tinha substituído o simples pelo natural. Mas natural é o que é produzido pela natureza sem a intervenção do homem e, neste caso, parece-me deveras improvável que, espontaneamente, sem a intervenção do grande manipulador, o Lactobacilus bulgaricus tivesse causado a fermentação do leite dando origem aos produtos coagulados, alinhadinhos ao longo de todas aquelas estantes, cuidadosamente dispostos com os prazos de validade mais longos colocados em posições menos acessíveis e os mais caros ao nível onde mais fácil as mãos chegam. Por isso, com o devido respeito aos senhores do marketing, o coagulado é muito mais simples que natural.

quinta-feira, abril 13, 2006

Veja onde o faz

Não leia isto que é pecado. Leia o texto comprado na sua paróquia e conquiste a salvação!

Troica

«Graças ao Senhor,à Nossa Senhora de Fátima e ao Doutor ela fez-se senhora.»
De fora da troica ficou a pílula, verdadeiramente responsável, atestando, mais uma vez, que os verdadeiros construtores da obra ficam, com frequência, no anonimato e a fama é apoderada pelos que têm melhor promoção de imagem.

quarta-feira, abril 12, 2006

Manhã e tarde

Primeiro a casa nova, possivelmente, a última casa. Esta cheia de luz na principal diferença. Tudo começou por um acaso, num dia no piso 2, quando me calhou ir até ao piso 4 para fazer Medicina Interna. O local era absolutamente inadequado para isso. Aos poucos foi acontecendo a Endocrinologia, até ao dia em que uns estalos na cara do Director nos levaram até um exílio no piso 2. Mesmo assim, foi passar de uma assoalhada a 2... Depois, a longa estada no piso debaixo. Agora, a quase ascensão ao topo, até à luz.
Depois, o tributo ao bom senso. Uma forma de estar anti-liberal, trabalho solidário com a fragilidade. Só pelos sorrisos, mas com alguma noção de dever. Dever literal, que o crédito é grande de quem agora embrulha os passos no caminho e as palavras no discurso. Alturas houve em que me esperavam de braços estendidos quando era eu quem embrulhava os passos e ainda desconhecia as palavras que aos poucos me foram arrancando.

terça-feira, abril 11, 2006

Contradigo

Um mundo que gera cada vez mais fracos (os idosos) não pode ser governado pelo livre arbítrio dos mais fortes. Mais cedo ou mais tarde teríamos o genocídio dos velhos com todos os bons argumentos que o poder sempre inventa. A humanidade está condenada à solidariedade e esta é uma acção fundamental do Estado, seguramente mais importante do que a criação de condições para os mais fortes o serem cada vez mais, sendo cada vez menos. Não é com marginalização de grupos cada vez maiores que o Estado satisfaz a sua função; tem de orientar-se para a criação de barreiras e limitações à normal expansão da selvajaria que é da natureza dos homens. Por isso, precisamos de mais Estado e não do contrário.

segunda-feira, abril 10, 2006

Intervalo

Perdido no meio de nada acontecer, que quotas ou não para mulheres e nascer ou não em Elvas quando Badajoz está ali mesmo à vista e com maternidades seguras, é mesmo nada. Ou pior que nada, quando se vê o argumento patrioteiro sair da boca de quem parecia capaz de não ceder ao fácil. Nada, tudo isto é muito pouco ou quase nada.
De caminho passei por Glasgow, cidade onde apenas se deve ir a caminho de alguma coisa como a mim me aconteceu, de um Congresso Europeu de Endocrinologia, mas mais do que isso da possibilidade de nascer algo que enfrente a poderosa América, à primeira reunião da European Society, titubeante ainda entre interesses patrioteiros e a afirmação do global, condição única para ser grande, mesmo maior que a Endocrine Society. Que o Norte se imponha ao Sul e o caminho será fácil!
Em Glasgow vi, como um Lord de outras eras aqui viu também, gente porca cuspir no chão e disso aqui deixo registo. Uma terra onde é diariamente sexta-feira tal o índice de bebedeira que nas suas ruas se observa. Um escarro neoliberal. Em coisas e paisagens muito semelhante a cidades americanas do interior, de ruas direitas e largas onduladas pelas colinas suaves. São Francisco, sem porto nem leões marinhos e também sem Alcatraz e sobretudo sem Sausalito.
O resto foi tudo coisa vista. De cá meia centena de clínicos gerais em passeio com argumento de congresso, as mesmas conversas de jantares e de interesses que sempre se ouvem nestes locais. Tédio, bastante tédio e o risco de uns quilos a mais no regresso.
Chegado entre notícias de vitórias impossíveis, que Liverpool não acontece duas vezes, surge de novo o nada acontecer até que hoje, finalmente, Chirac cedeu e Prodi talvez ganhe. Do mal o menos, que mais não gozarei que pequenos contentamentos, tal a falta de crença a que cheguei.